Cinco poemas de hermes de sousa veras
hermes de sousa veras é antropólogo e escritor. Nasceu em Fortaleza, Ceará e já morou
em Belém do Pará e Porto Alegre. Atualmente conclui sua tese de doutorado em Ananindeua, região metropolitana da Grande Belém, metrópole amazônica. Tem contos
e poemas publicados em revistas e suplementos literários, faz parte do time de poetas da
Fazia Poesia e administra o perfil de minicontos @viu.eitanem. Em 2020 foi selecionado para as antologias Orifícios Políticos (conto, editora Gosto Duvidoso) e Quantos players hoje – poemas do arcade ao console (poesia, Patuá/Fractal).
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5 poemas desenganados pela medicina
I
você chega e eu tiro o seu chapéu
não uso acessórios
preciso evitar calvície.
desabotoo seu terno
revelo sua imagem de poeta
em cuecas e camisas
lhe passo um café
e sem vergonha alguma
despossuídos de mistério
confabulam contatos
nossas peles
até que recordamos do café
está frio
habita xícara medrosa.
II
Visito tua casa no recife Antigo,
Ninguém abre a porta.
Sento na poltrona diante tua figura
Tua cabeça enorme teus braços imensos
maiores que a tristeza.
Esse encontro espanta
A insistência da morte
Um Manuel mamulengo imóvel
Com viço nos olhos
Bota pra correr
a iminência da morte
a presença do morto.
III
te chamo pra passear
vamos ao parque, bons ares
isso te atrai.
é de manhã, a Estrela maior lumia
nos abrigamos na sombra dum quiosque
e quando nos damos em si
já foram três cervejas por cabeça.
uma sombra nos olhos
um peso na alma e tu me diz
não posso beber mais que morro.
te chamo pra correr na próxima semana,
não posso correr que morro.
falo de Adelaide. ninguém mais sabe de Adelaide,
ao contrário de Janaína.
não posso namorar mais que morro.
nos lançamentos tristes ao gramado
de caneta e caderno em punho
tu escreve poemas como quem morre.
IV
Manuel Bandeira me convida pra passeio
visto um terno tropical
eu que nunca usei um
encero & encerro-me em sapatos
e na noite, a gente se perde
encontra as mulheres mais tristes pra namorar.
elas mal nos olham
envergonhadas nossas cabeças imensas pesam
Tristes andorinhas Tristes
cantarolam sem prumo, ritmo e melodia:
– todo semblante é etéreo/nesse cabaré fechado
cabisbaixos poetas se encontram feios de doer
ao nível do chão e pensamento.
V
Você me manda uma carta não correspondida
como poderia, meu Deus
ser respondida
se todos nós saímos de nossas províncias
e fomos nos amontanhar em arranha-céus
você não recorda
meu endereço alterado
aí você telefona
escuto uma respiração funda cansada triste
no céu escuro brilha uma estrela
e já não estou mais sozinho
dou meu novo logradouro, cartas vindouras
agora são possíveis.
amanhã pretendo comprar pão, leite, milho
a solidão espantada rasga apetite
mas esse dia não veio
sem aviso prévio, sinto na goela o aperto dela
fora da curva e do milagre
a Morte me sufoca
o dia amanhece com um poeta a menos
e tu perdura vivo
desenganado pela medicina
vivo sempre vivo.
José Tadeu Gobbi
Hermes
trabalho Maravilhoso.. Viajei na narrativa, nas imagens encadeadas poeticamente.
Bravos.
Bandeira ficaria orgulhoso em ter sido teu personagem.