Cinco poemas de Lucas da Costa Silva
Lucas da Costa Silva nasceu em 1997 na zona leste de São Paulo. Lança em 2018 o livro Do avesso (Editora Multifoco).
Os poemas abaixo fazem parte de Do avesso.
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Quando a lua aquecer os meus pulmões ensanguentados
E a carne converter-se numa pétala macia
Que cristaliza e acidula os meus ossos
Gritarão apaixonados os meus dedos
Que tateiam a vasta escuridão
Quando pelos seus olhos
A lua decretar o meu ofício
Esverdear as padarias
E colorir os prédios
Flutuar nas pedras das praias
Pra purificar os órgãos abençoados
Ajoelho no seu quarto para as joaninhas
Amortecerem meu medo
Para a vermelhidão ácida acolher meus poros
Em forma de ilusão
De sonho acordado
De sal e açúcar
As covas mudam de lugar
Enquanto os animais coroam o nascer do dia
E eu seu rosto que emerge dum éter infértil
A florir e atordoar meu canteiro de lamúrias roxas
*
Cruzar caminhos arboriza todas as minhas esquinas
As raízes alfinetam as entranhas
E se deitam como palco
Das mais expressas flores
Do nosso encontro
Na firmeza de um tronco os laços
Que penduram a rede da paz
Que floresce meu descanso
No seu abraço
Múltiplas folhas brotam
Por cada afeto que aviva como o próprio sol
E mesmo ao caírem no outono
As cicatrizes serão a própria fotossíntese
Que fincará um ninho
Para os meus pássaros
*
Pela janela semínimas lambendo pausas
Cada clave é você no meu corpo
Ao arquearmos as mãos oitavadas
Primeiro e segundo movimento
a regra das clássicas sinfonias
Ávidas frases soam a melodia
Só vivente e sussurrada ao pé ouvido
Sob um manto de sons seus olhos a pausa
Para recriar-se o lirismo
Autônomo clareando sua sombra
*
Não cabe em mim mais nada
Mesmo que minhas portas
Sejam as de um armário vazio
Duma casa inacabada
Mas você pode se masturbar e entorpecer
Em qualquer recanto
Expurgarei como um vômito na fachada
As lindas cores que você joga
No teto
E lâmpadas verdes nas sórdidas paredes da sala
Invadem a morte com o tempo
Seus movimentos allegro
Entrelaçados em distorção e blestibite
Sua progressão pulsa toda poeira
Que vai pairar na luz
Do pôr-do-sol de julho
*
Que caminhos sintáticos devo percorrer pra te constituir?
Em cada passeio ao fluxo da caneta
Você nasce e aflora
E não sou eu o sujeito da criação
Mas apenas você
Em fluxo de consciência
Sopra sua própria vida
Lhe faço estradas de aliterações
Para que seus pés em automatismo
Carreguem o sentido desta estória
Sei que perneia por outros versos
E outras línguas
Mas o meu lirismo é sempre
Um teste de pincéis para o seu retrato
E nenhuma língua ou linguajar
Basta pra te realizar inteiramente
À minha escrita você vive
Mas não morre no ponto final