
Cinco poemas de Lucas Perito
Lucas Perito (São Paulo, 1985) é graduado em Comunicação em Multimeios pela PUC-SP. Escreveu livros ligados à história e à fotografia, elaborando os textos de acompanhamento para o livro fotográfico Caminhos da mantiqueira (2011) de Galileu Garcia Junior. Publicou seu primeiro livro de poemas, 38 Movimentos, pela Lumme Editor (2018). Tem poemas publicados em algumas das principais revistas brasileiras, além de algumas revistas de Portugal, Espanha, Galícia, Colômbia e Peru. Tem traduzido Charles Cros, David Diop, James Wright, Amparo Osorio, Abdellatif Laâbi, María Emilia Cornejo, Jacques Prevel, Hector de Saint-Denys Garneau, entre outros.
***
Ciclo de Caça
Sempre foram as distâncias,
o nascimento dos peixes
e o relógio que me obseda.
Há muito tempo
escolhi meu sexo
e deixei aves sobrevoarem.
Vivi no meio de ubérrimo lago
assediando o fim da noite.
Modifiquei minha posição
tropecei numa cabeça
consumei o rabo de um animal
Vi o pássaro dormido em meu pai
Lembrei a mão que não toquei.
Remir – primitivamente
assumir os passos em falso
e tomar a dor como deleite.
*
Humanidade
“el dolor crece en el mundo a cada rato”
César Vallejo
Carregamos o fardo de toda uma espécie em extinção.
Onde não há mais espaço para os tygres
Respiram, inelutavelmente, sob o peso das águias,
Panteras degradadas entre grades tramadas
Sobre o vermegro falar das horas.
Elege-se um útero final
Abatidos retiram a pele da pele
[e da pele
Algures traçarão rotas diversas
Comendo dores de um som medianamente igual.
*
Ofício para um Ouvido
Que margens do medo
(dobras do espelho)
bordam a máscara
do papel entre
um lado
e o final da palavra
[silêncio?
*
Degredo
Indexado entre a língua e a pele
exilado no corpo
como massa informe
dispersa o eco e a matéria.
Nomeio dentre os selvagens
[os mais modernos
do outro lado da noite.
Fraturado frente às costelas
manchado entre uma cidade
desenha-se um acidente biográfico.
Sem rumo, vagam vagas,
[sem rumo
despenca atado a um gosto na boca.
*
Figuras de Manejo da Memória
Busco um rosto retirado de duas mãos
Se completam e desfazem
São cavalos sobre o sal da terra
– Silenciam.
Persigo um rosto e pertence à noite
Em ruínas que só as raposas conhecem.
Uma lanterna aponta, em um quarto – unidas –
Vozes úmidas conjuram os nomes de origem
Em algum lugar do espaço
Correspondem-se, sem razão,
Duas feridas e um fruto mordido.