Cinema Negro: cinco preciosidades
Cinema Negro: cinco preciosidades é uma curadoria realizada por Amanda Nery, que atua como produtora cultural desde 2013, coordenando desde shows musicais, exposições e instalações de artistas como André Gorayeb, Rogê Além e Clóvis Irigaray. No audiovisual, atuou como diretora de arte no filme A Velhice Ilumina O Vento de Juliana Segóvia (que está em fase de pós-produção) e no videoclipe Tá vendo, seu moço de Karola Nunes. Fez parte de três edições da Mostra de Cinema Negro de Mato Grosso como produtora e em 2020 estreia como curadora.
Atualmente, estuda o cinema negro em Mato Grosso como mestranda do PPGAS da UFMT.
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Cinema Negro: cinco preciosidades
O cinema negro brasileiro é cheio de obras fantásticas. É difícil dizer que “cara” ele tem, afinal, as histórias são tão plurais quanto as vivências das pessoas negras. Desde que Zózimo Bulbul usou esse termo pela primeira vez nos anos 1970, o cinema produzido, pensado e feito para pessoas negras cresce mais do que nunca, a cada ano surgem novas produções, festivais e mostras voltados para esse gênero que é ao mesmo tempo cinema, movimento social e modo de pensar a arte. A convite do Ruído Manifesto, aceitei a difícil tarefa de escolher os meus cinco filmes preferidos de cinema negro nessa semana em que a V Mostra de Cinema Negro de Mato Grosso do Coletivo Audiovisual Negro Quariterê está acontecendo em sua primeira edição online.
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5. Dia de Jerusa de Viviane Ferreira
Viviane Ferreira é um nome importantíssimo para o cinema nacional, e especialmente para o cinema negro. Recentemente, foi eleita a presidente do Comitê Brasileiro de Seleção do Oscar 2021. Nesse filme, Viviane conta a história de uma mulher negra idosa e solitária que ao receber uma pesquisadora em casa faz o papel de griô (ou griot), a matriarca que fala de seu povo e ancestralidade. Esse encontro geracional nos lembra da importância dos mais velhos em preservar nossa memória comunitária através da oralidade. Essa narrativa quebra com a expectativa que se cria em torno de personagens negras fortes e inabaláveis e mostra as fragilidades da solidão dos idosos negros.
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4. Como ser racista em 10 passos de Isabela Ferreira
É claro que nessa lista não poderia faltar um filme feito em Mato Grosso. Considero a estreia desse filme um marco do cinema negro no estado. Ele estreou no Auditório do Centro Cultural da UFMT ultrapassando a lotação máxima (nos tempos em que a aglomeração ainda era permitida) e, com certeza, ter estado lá foi uma experiência memorável para o público e para os realizadores. O filme foi produzido como parte do TCC da diretora e mostra 10 esquetes exemplificando como o racismo está presente em todos os aspectos do cotidiano.
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3. Cores e Botas de Juliana Vicente
Quem nunca sonhou em ser paquita? A diretora Juliana Vicente nos leva numa viagem no tempo, para a década de 1980, trazendo todas as cores e sons da época. A protagonista se prepara para uma audição para ser paquita, mesmo sendo uma menina negra muito diferente do padrão das assistentes de palco loiras, magras e altas que eram mini clones da apresentadora Xuxa. Seus pais são obrigados a se confrontar com as incoerências muito comuns nas famílias negras de classe média de que é possível superar o racismo com esforços individuais e ascensão econômica.
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2. Temporada de André Novais Oliveira
Único longa dessa lista, Temporada é um filme perfeito para conhecer André Novais Oliveira, um diretor mineiro com um estilo original e ousado, como podemos ver em outras obras como Fantasmas, Pouco Mais de um Mês e Quintal. A história nos leva a acompanhar Juliana, uma mulher recém-separada que se muda para uma nova cidade e conhece novos amigos, novos amores e começa um novo emprego.
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Esse talvez seja o meu filme preferido de todos os tempos. É centrado na vivência da mulher negra com sua estética, especialmente seu cabelo. A relação de homens e mulheres negras com o cabelo é tema de muitos filmes de cinema negro (como “Enraizadas”, selecionado para a V Mostra de Cinema Negro de Mato Grosso) – longe de ser um tema fútil, a relação dos negros com o cabelo é uma jornada de negação e aceitação dos traços negros. Não é à toa que muitas mulheres, ao passarem pelo longo processo de transição capilar, também se confrontam com a própria identidade racial. KBELA fala disso em uma linguagem muito própria e única. Yasmin Thainá é, certamente, um dos grandes achados do cinema negro brasileiro.