Copa do Mundo – “Es Cecilia” (Costa Rica) – Por Wuldson Marcelo
Es Cecilia. Direção: Kattia González. País de Origem: Costa Rica, 2012.
Dois sentimentos atravessam os 22 minutos de Es Cecilia, da atriz, diretora e roteirista Kattia González: a necessidade de se encerrar um ciclo e a expectativa pelo futuro, porém incerto. Passado no início dos anos 1980, o curta-metragem acompanha Cecilia em seu novo apartamento, em San Jose, capital da Costa Rica, logo após o seu regresso da União Soviética.
Na maior parte de sua duração, Cecilia está sozinha, dedicando-se à atividade de desempacotar os objetos e ajeitar os móveis. Um misto de preocupação e contida felicidade são perceptíveis em seu rosto. A atuação da atriz, diretora, roteirista, editora e produtora Alexandra Latishev (que tem em seu currículo o curta-metragem Irene [2014]) é bastante convincente neste sentido, transmitindo a inquietação que cedo ou tarde se traduzirá em desabafo.
Logo no início, deparamo-nos com Cecilia a ensaiar um telefonema que, evidentemente, é fundamental para certificar a sua presença na maior cidade costa-riquenha e romper os laços com o passado, a sua ligação com um homem chamado Oleg. A mudança passa pelo que precisa confessar a ele. Com o telefone vermelho em mãos, ela pratica como começar a conversa – sem conseguir efetivamente realizar a chamada. Durante esses esboços, é uma Cecilia vacilante que retira o aparelho do gancho, deixa transparecer que ainda não consegue falar o que precisa.
Nestes momentos de hesitação, ela recebe um telefonema misterioso, em que uma mulher (a voz de Kattia González) pergunta em que pode ajudar Cecilia. O estranho oferecimento causa incredulidade e irritação em um primeiro momento. No entanto, em uma segunda oportunidade, até em tom desafio, Cecilia expõe sua solidão e o desejo por companhia, no que logo é atendida com a presença de visitantes.
Cecilia recebe novamente o telefonema da voz misteriosa, assim que sua perturbação com o barulho dos vizinhos chega ao ápice. Um novo pedido dela é atendido por quem está do outro lado da linha. O que vem a seguir obriga Cecilia a confrontar sua angústia e encarar seus sentimentos.
O curta-metragem de Kattia González é falado em espanhol e russo. Na conversa imaginária de Cecilia com Oleg é o idioma da ex-república soviética que predomina. O retorno ao lar de Cecilia não apaga os lastros de seu passado em que pronunciar sua felicidade atual é uma forma de libertação.
A baixa intensidade da luz contribui para destacar tanto a assepsia – paredes brancas, os espaços de um lugar em construção – como o vermelho que surge em várias cenas, principalmente o telefone, o sofá e o cobertor. São os estados emocionais de Cecilia, na superfície, uma aparente felicidade (presente, mas interdita pelo não-dito) e em seu interior, a necessidade de pronunciar “esta é minha vida e não vou mais esperar”. Kattia González trabalha contrastes, em uma Cecilia que conserva o vermelho, cor preferida de Oleg, mas precisa dar o passo decisivo para a ruptura total com a sua vida no estrangeiro.
Es Cecilia afirma a dificuldade e a beleza dos recomeços.