Dois poemas de Camillo César Alvarenga
Camillo César Alvarenga (30), é poeta, tradutor e crítico, nascido em São Félix, no Recôncavo da Bahia. Autor do livro de poemas Scombros (Edufrb, 2012) e organizador da antologia de poetas baianos Canoas do Paraguaçu (Edufrb, 2012), publicou o poemário OFILTRO (Coleção Oju Aiyê, Portuário Atelier Editorial, 2013), e recebeu o Prêmio Maximiano Campos de Literatura (Instituto Maximiano Campos) na categoria Micro-Contos (2013). Traduções suas para alguns poemas de Langston Hughes, acompanhadas de um breve ensaio, foram publicadas no blog escamandro, também foram publicados poemas autorais no blog da editora portuguesa Enfermaria6 e no blog da livraria Boto-cor-de-rosa. É colaborador do site Rap Nacional Download (RND). Este ano lançou macumbe-se, pela editora Kza 1. Vive e trabalha em Olinda, Pernambuco.
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Deve ser muito triste
Quando se ama e
se precisa esconder
um sorriso do outro,
deve ser muito triste.
Deve ser muito triste
a todo tempo ter que
apagar mensagens, con-
versas, conexões wi-fi,
deve ser muito triste
viver tendo que sumir
com tudo o que se vive
deve ser muito triste,
deve ser muito triste
ir a lugares e omitir
o paradeiro, deve ser
muito triste mentir o
destino em que se está
por inteiro, deve ser
muito triste ver fascistas
no poder, deve ser
muito triste o poder,
deve ser muito triste
seguir sem fé nem
esperança, deve ser
muito triste amar sem
segurança, sofrer abuso,
se assujeitar, deve ser
muito triste não conseguir
negar o desejo do outro
que é nos dominar, deve
ser muito triste amar
quem nos deu e nos fez
tirar, perder um filho,
deve ser um inferno
encontrar consolo no
outro, mas ainda
temos a praia. Deve
ser uma tristeza ver
que na luz e alegria
dos olhos não há beleza,
deve ser uma tristeza
ver que a vida oculta a
permuta na letra da luta
e que o tempo procura à
saída a estrada larga, que
a sorte assuste os desavisados
e acerte as contas com
os bem nascidos, contato
a contato, que a solidão
possa ser alívio para quem
tem enfim um caminho
para estar ao lado de si
e do outro, essa espécie
de mais de nós e menos
do mesmo medo além,
que deve ser muito triste.
*
Fascismo à brasileira
Façamos Kwanzaa!!!
Êahhh, Êahhh….
Pela festa do fruto
Pela fresta do futuro
Vem o Sal da Terra…
Façamos Kwanzaa!!!
Êahhh, Êahhh…
Para que
que não hajam
mais noites
como essas,
estas ou aquelas…
corpos negros
condenados
à ostentação
dos suplícios
(mimese moderna
sub-burguesa)
– a condenação
é a morte.
o púlpito nu
na igreja,
na praça
torturas
corpos
aos pedaços,
cinzas
ao vento…
quem busca
socorro em Deus
encontra em Jesus
seu carrasco,
paciente açoitado
pregando
sentenças oficiais
INSPEÇÃO –
: horário para ensino e trabalho
silêncios nas celas em ordem
no pátio, nas ruas, na oficina
lavar as mãos, comer, vestir,
e
despir a moral comovente;
sem massagem.