Dois poemas de Mardson Soares
Mardson Soares. Poeta. Advogado. Um de seus poemas, intitulado “Ao Piauí, as enrribas!”, uma homenagem ao Piauí, seu estado natal, foi um dos selecionados para a Mostra Literária da 9ª Bienal da UNE, em 2015, no Rio de Janeiro.
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Eu sou o Brasil profundo. E antes dela eu não sabia.
Quando vi samba de coco achei tudo muito esquisito.
“É porque você não está acostumado”, disseram.
O que é diferente não é banal e causa olhar arredio, estranhamento.
Os brasis reunidos não é coisa banal.
Eles proclamam uma voz uníssona de estranhamento mútuo.
Quando um mineiro de Juiz de Fora viu massa para se fazer cuscuz ele estranhou.
Assim como estranhei os acarajés.
“O pato no tucupi tem jambu”.
Eu sou o Brasil profundo. E antes dela eu não sabia.
Vi frevo e maracatu. A dança da fita já tinha visto na minha terra.
Vi saudades do mar.
E alívios da distância do Atlântico – que não fica no ar do desejo.
“O mar daqui é o céu”, dizem isso.
Vejo que o tempo do mar acabou. Sim, acabou o tempo do mar.
Eu sou o Brasil profundo. E antes dela eu não sabia.
Os brasileiros dos litorais não compreendem.
Brasília não foi feita para quem quer morar em Ipanema.
Eu não quero morar em Ipanema.
Eu não sou da civilização do mar.
Eu sou o Brasil profundo, que se anuncia e não se ouve.
Eu sou das Minas e de Goiás.
Do Piauí e do Mato Grosso.
Sim, ruíram os litorais!
Eles marcham para o além-mar, porque é o que sua visão alcança.
Eu marcharei para o Brasil.
*
Aldebarã
Quando o amor vier
amar o mundo
avisa-me por correspondência,
pois costumo deixar
minhas portas e janelas
encostadas
Quando a esperança vier
avivar o mundo
avisa-me pelo vento,
pois não há noutros
cantos ou lugares
mensageiro tão quanto
operário
O alcance do vento é
opalino e humanamente
inimaginável
Os adeptos a mensageiros
são geralmente gazeios – não o vento!
O vento não
Mas,
quando a antiga canção
vier ser ouvida pelo
mundo,
não precisarás, tu, avisar-me,
pois d’onde estiver
conseguirei senti-la…
junho de 2007