Quatro poemas de Laura Navarro
Laura Navarro. São Paulo. Fevereiro de 2000. Gosta de se reinventar, principalmente por meio de devaneios, paixões e simbologias ocultas. Estes que lhe renderam a publicação de Claire de Lune (Patuá, 2016) e Natasha (Patuá, 2018), além da plaqueta Sinestesia (Primata, 2019). Inspirada por diversos movimentos artísticos e literários, se liga principalmente ao simbolismo, ao arcadismo, ao ultra-romantismo e ao expressionismo, tendo ligações com poesia erótica e as de cunho puramente experimental, que abordam uma infinidade de diálogos, em especial com teorias da psicologia, do teatro e da comunicação. Laura é, atualmente, estudante de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, e divulga regularmente seus textos no blog GOTH MATRYOSHKA (gothmatryoshka.tumblr.com)
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ROSAS PÁLIDAS
minha pele alva é irradiada por luvas corpóreas
para que eu pudesse admirar o Pecado original
este que se constrói, amar o Amor em resoluto
em cãibras que envergam as hastes do meu corpo
desabrocho em fins de rosas pálidas em contraste ao ébano
imperiosamente,
meu talento na vida sempre foi o de tomar rumos paradoxais
mas, se por enquanto, não houver ruína
eu me resplandeço, amortecida,
e meus sonhos se juntam às garrafas vazias da sala
minha alma sempre voou, e quis denotar corpo
mas acredito que a minha afirmação se faz em altos e baixos
como um transitar em diversos ângulos de uma câmera
ao final do dia, as rosas e os narcisos são flores, sim, e há bem querer
por isso, concluo
carpe diem, dito que nada é eterno, nem eu, e nem você.
*
Água Viva
(para Rafael, que me ajudou a revisar)
Mover as mãos sob o espelho
da beleza angustiante
gelada ou
histérica? Não:
a ponto de queimar alguém
ou de se queimar
questão de retroatividade
É preciso tolher as lentes
polir a fim de tatear o mundo
com maior facilidade.
*
TAROT
O incenso aceso incendiado de
fumaça azul, oblíqua e dissimulada
azul que não se pode comer
mas que se pode aspirar –
cheiro de ópio
Tiro as cartas com duas facas
uma em cada mão
ambas sangrando o sangue de
todas as minhas indecisas veias
loucas para tomar partido
(que elas fingem não saber)
a Morte, ou a Fuga?
Uma grande piada, talvez
Apenas atiro os meus Enamorados
ao mar, e a indócil densa
água das garrafas de vodka
nos engole, todos nós.
*
Fome
Corro em direção às lentes da câmera
De seus olhos, manchados de ópio
Meu espírito, famélico da sua fome, impera
Cozinho seus pedaços para nutrir a arte
Numa fagocitose tempestuosa
Dedos amarelos de tabaco
Dos cigarros que fumo, na tentativa vã de
Limpar triangulares paradoxos
Não como do corpo, quero me embeber de sua alma
A fim de criar a pura minha
Devoro porque não quero
Ser devorada tampouco decifrada
E sou devorada porque a culpa
É devorar
Enquanto for de amores, porém
Me contento com essas autofagias.