“Mandinga” (2016) – Por Andreza Pereira
Mandinga. Direção: Wagner Novais. País de Origem: Brasil, 2016.
O sagrado pro sangue sem cura.
A mira sobre Mandinga é a de um menino; um menino de oito anos, que, em sua altura e alcances, escava toda a história. A escolha da personagem que conduz a narrativa e do ponto de vista por que o faz é central no curta de Wagner Novais. É o elemento que confere estranhamento e acaba por reposicionar a realidade retratada no filme.
O conflito que engata a história é o sangue que desce, sem machucado, pelas pernas da amiga do menino protagonista. O sangue saindo do corpo, para ele, para ela, sempre foi rota errada, arranco. Não sabiam daquele sangue que saía sem ser desviado da pele aberta. Sendo sangue, o menino vai em busca de cura.
Ele sabe onde os grandes tratam de cura. Quando sobe no muro vizinho, consegue ver do outro lado o terreiro e as mulheres negras de branco, e os tambores. Elas giram descalças entre árvores e ritmo diante de um altar aceso. Fugindo do quintal, o que chama a cura tem penas pretas e estica muito a garganta pra escapar da morte.
O sagrado dos grandes, pro menino em parecença de magias, está também coberto sob teto e paletós. Na igreja sem velas, o pastor fala sobre poder e reforça nele o desejo pela cura. O menino tem a sua própria magia e vê a galinha preta grande feito gente. O animal coloca-se no curta, então, como animação, acrescentando uma nova textura às imagens e sobrepondo uma nova camada imaginativa àquele universo.
No fim, as coisas voltam a antes, à arvore da primeira cena, e o menino acalma-se ao saber pela mãe da amiga que o sangue que desceu nela não é de se curar. Ele não tem mais carência de correr pelo chão ciscado e pode subir no topo da árvore. Num bonito e móvel final, descem vermelhas flores sacudidas pelo amigo sobre a menina que ri.
* Texto escrito a partir da programação (mostra competitiva) da 3ª Mostra de Cinema Negro de Mato Grosso, em Cuiabá (MT), ocorrida no período de 09 a 11 de novembro de 2018.
** Andreza Pereira. Possui graduação em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo e em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Mato Grosso. É Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos da Cultura Contemporânea, onde pesquisou a relação entre Jornalismo e Literatura. Escreve para o Parágrafo Cerrado.