Poemas de Lívia Bertges
Lívia Bertges é professora, pesquisadora e escritora. É doutora em Estudos Literários (PPGEL/UFMT) com estágio doutoral na Sorbonne Université (Paris, França). Publicou artigos e poemas em revistas, antologias e sites. É parte do corpo editorial da Revista Digital Ruído Manifesto e integrante do Coletivo Literário Maria Taquara – Mulherio das Letras (MT).
Créditos de imagem: Mariana Keller
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Alça
para Rodivaldo Ribeiro
Alça o infinito e voa com o grito.
Fica a revolta. Volta.
Entorta a matéria presente
no tempo cansado.
Vivo o uivo marcado
cobra o incandescente do margear.
Corta a memória.
Gargalha,
cria e inicia.
Realça.
*
Vida
Rememorar os silêncios
escondidos em cada verso perdido.
Exercício de escuta e espera.
*
Horas esparsas
para Matheus Guménin Barreto
Há dias em que as ouço
em horas esparsas
em dias de sorte
três ou quatro vezes.
Em outros tantos,
elas passam ao longe,
as identifico,
são as araras.
Elas aos pares.
Há dias desejantes
a ouvi-las.
Algo distrai a escuta,
prevejo,
elas passam, certamente passam.
Com afago gosto
da surpresa escandalosa,
elas passam.
Rastros esculpidos
no céu aos gritos
me espiam do invisível.
Espiam a casa. Elas passam.
A passagem delas,
como de qualquer outro ser,
anuncia a vertigem
ao flutuar.
Talvez seja este o aprendizado,
flutuar e seguir
alguma rota presente.
Concluo o pensamento.
E elas passam.
*
Corpo-dobra
para Thaís Rocha
Amar a dinâmica
do dobrar e redobrar-se.
—Refazer os caminhos da Terra:
corpos, cores, raízes,
tudo medido no toque.
Nas pontas dos dedos,
diante do singular plural,
desenham-se rizomas
move o corpo.
Lembra ali,
mais uma vez,
as funções vitais,
o respirar de pulmões,
em sobressalto ao recriado,
abre o coração espantado:
amar os micro segmentos
visíveis e impossíveis.
— Corpo-ritmo. Corpo-espaçamento —
Aguardar as novas
feituras do devir.
Corpo-dobra,
elástica mola-Ser.
*
Corpo-Ser
Corpo que toca outro ser,
quente ar do contato,
cortamos os silêncios
e nos encostamos.
Todos os toques
pontuam qualquer geometria.
E no embalo do corpo-ser,
amanheci com os pés
embebidos na Terra.
*
Paremos
Paremos para chorar
as lágrimas rasgadas
nas esquinas.
Paremos.
Paremos para observar
as trincas nos muros
do mundo.
Paremos.
Paremos
até escutarmos
a respiração ofegante.
Paremos.
Paremos
no torcer dos membros.
do corpo nosso
e dos outros, idênticos.
Paremos.
Paremos na encruzilhada
da vida
que indica:
Paremos no amor;
Paremos no amar.
e postergaremos…
Paremos
para assumir
o desfecho.