Quatro poemas de Diana Junkes
diana junkes nasceu em são paulo em 1971. é poeta, crítica literária e professora de literatura na universidade federal de são carlos. dedica-se ao estudo da poesia brasileira contemporânea, particularmente, à obra de haroldo de campos. dentre suas publicações destaca-se o livro as razões da máquina antropofágica: poesia e sincronia em haroldo de campos pela editora da unesp/2013. como poeta publicou em revistas eletrônicas e blogs e é autora de clowns cronópios silêncios(2017) e sol quando agora (2018), pela editora urutau.
Os quatro poemas abaixo foram enviados sob o título “quatro poemas da praia brava” e fazem parte do livro ainda inédito asas plumas macramê (laranja original, no prelo).
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1.
a família ocupa a praia a mãe dois filhos duas filhas os irmãos jogam frescobol as irmãs entram na água com vestidos abaixo dos joelhos a família espalha seu lixo o som no último volume a mãe senta-se sobre uma bandeira do brasil para fazer castelos um quero-quero sob o bombardeio da bolinha de borracha protege aos gritos o seu ninho frágil você de camiseta vermelha e boné patrulha a praia é preciso defender os sonhos que singram e a sutileza das montanhas a qualquer custo daqui de onde estou olho o ferimento por dentro sem notar a cicatriz observo tudo como uma concha espera a revolta proletária dos grãos de areia reivindicando suas fomes sinto que cem fuzis entre estrelas silenciarão todos os assassinos do sol
*
2.
chovem latitudes há algumas horas tudo desorganiza o trópico de capricórnio que passa por aqui o escuro constela do lado de fora das imensas janelas lençóis nuvens irrompem crepúsculo por entre as arestas a noite e o vento vamos proclamar o que importa há pouco você ergueu meu vestido enquanto eu diluía o leite de coco no calor da panela visitou meu corpo e gargalhamos aromas à beira do fogo feito cigarras suas mãos nas minhas ancas a colher de pau em minha mão não há mais volta sabemos disso nos tijolos das paredes penetraram meu gozo meu grito seu grito seu gozo nosso canto louco antecede o verão que se aproxima o sal rosa hybris em nós que se rebela
*
3.
cave meu bem
a pequena flor carnívora
até o talo respire o ar
de orgasmos dos meus
pulmões até tornar
láctea a delicada arcada mínima
as palavras da minha boca
depois me abrace meu bem pelas costas
para que eu sinta entre as costelas
seu coração arfando e esta mudez
possível apenas aos que ultrapassam
os muros da linguagem
*
4.
na praia brava sentir-se nada ou nunca ou silêncio dá na mesma o que muda de fato é que ninguém não será o mesmo as utopias picotadas espalhadas em voltas pelas escadas de pedra estão submersas nas notícias mas falemos sobre nós você e eu aqui nesta ilusória orla suspensão do tempo em meio ao caos em busca de ar e ar e ar e ar palavras que se deitem no limiar entre os nossos corpos quando todos os sentidos se encantarem e passarmos a nos saber pelo olfato tato audição paladar cegos entre avessos enquanto ainda resistirmos nesta praia brava neste lugar das canoas ubatuba como um dia os tupinambás bem aqui eu lhe digo aqui onde língua pulsa onde a língua cede onde a língua sede onde a língua bebe onde a língua luta onde a língua abisma e veste o que reste na espuma do mar deslizando sobre as pedras que a penetram formando um macramê tênue renda de orgasmos memórias ruídos o mar é uma mulher a mar de abertas pétalas que envolvem você e me envolvem e em nós revolvem a poesia é um
dô