Quatro poemas de Elizza Barreto
Elizza Barreto tem 25 anos, é baiana radicada em São Paulo e bissexual. Vive o melhor dos seus dois mundos, atuando como Psicóloga da saúde e clínica, e como escritora. É autora de dois livros: Cappuccino de Chocolate com Creme (Romance | Editora Vecchio, 2019) e Afetos em Ruínas (Poesia | Editora Penalux, 2020). Faz parte da turma do CLIPE (Curso Livre de Preparação do Escritor da Casa das Rosas) de poesia. Tem contos e poemas publicados em antologias, como Corpo que Queima (2019), Ir Também é Ficar (2020) e Vejo Cores em Você (2020), assim como na revista Ruído Manifesto (2019). Publica crônicas e poemas em sua newsletter semanal. Acredita que os livros são vozes transformadoras.
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o chão de madeira falsa
experimenta meus achismos
nas sessões de meditação
ainda espero que o gesso do banheiro
despenque em minha cabeça mais uma vez
me divida ao meio com tamanha força
que o vizinho virá correndo
na porta, um aviso:
arraste parte do meu corpo
pela escada de emergência
solte-a na porta do prédio
retorne ao apartamento pelo elevador
vista o que sobra de mim com roupas grossas
embrulhe em um saco preto fedorento
e empurre sem muito esforço pela janela
para que encontre na calçada
a metade que foi despejada primeiro
então coloque-as lado a lado
equilibradas
pele, tronco, tripas
respire
inspire
concentre-se
diz a moça no vídeo do Youtube
*
Cuidado ao manusear
Ao lamber o sal de minha pele
Tenho gosto de deserto e uma rebeldia
Que abre as minhas portas e garrafas
Com a pressa de uma liberdade intimada
Eu grito se você me apressar
É melhor ir mais fundo
Mergulhar na maré baixa precavida
À espera de novas ondas
Que possam gastar as dobradiças e trancas
Tudo bem se a gente só caminhar pelas praças?
Alertas ao verde mais verde
Às cigarras trocando de casca, estampadas nas manchetes de jornais
E o tom de vermelho vivo respingado
Nos muros pichados
Tinta escorrida nas mãos sonsas
Ditas misericordiosas pelos pés do capital
massageados
Também podemos dançar
Rasgar previsões, números e esperas
Aceitar a visita de mais um outono
Que cataloga histórias em álbuns de fotografias
E diz, na queda de suas folhas secas,
Que veio nos buscar
Você não ouviu?
*
São sobreviventes
Os atletas que nadam
Os atletas que correm
Os atletas que gritam
Os atletas que cospem
Os atletas que suam
São sobreviventes
O capital
O pão
As manchetes de jornal
O ofício
O vermelho vivo nos punhos
São sobreviventes
O irônico
O hipócrita
O cômico
O espírita
O perverso
O verso
São sobreviventes
Os afogados
O suor dos afogados
O mérito diluído no suor dos afogados
E o silêncio, por fim
*
o futuro é um pronto-socorro
emergente
copos e garrafas e paredes pintadas
barulho até as cinco da manhã
não há protocolos
vai quem tem carteirinha
pacto com os podres poderes
ou mãos banhadas em vermelho vivo
sirenes e frequência cardíaca e oxímetros apitam
carrinhos de parada avançam nos corredores
há tempo
eles dizem no jornal
urgente é o agora
o que temos
afinal
senão os dedos agitados em teclados
e mensagens de despedida
olhos fixos na luz do teto
amarela de led
o futuro é um silêncio
um personagem difícil
um pão dormido pra molhar no leite
e dar gosto na vida
fantasia em cor neon
Fernanda Rodrigues
A Elizza é muito maravilhosa!
Que bacana tê-la aqui.
🙂
Elizza Santana e Silva Barreto
Obrigada pelo cARINHO! <3