Quatro poemas de Flávia Muniz Cirilo
Flávia Muniz Cirilo é cantora, compositora e escritora brasileira. Flávia estudou música na Unirio. Foi a vocalista da banda Luisa Mandou um Beijo, com a qual gravou 3 CDs e participou de coletâneas no Japão, Alemanha, Itália, Singapura, Galiza, América Latina. Já em carreira solo, lançou pelo selo espanhol Elefant Records o primeiro CD, intitulado Descalços sobre a Terra (2012). Em 2016 lançou O que a Terra quer ver, 2° álbum solo. Agora prepara o terceiro CD da “Trilogia da Terra”. Tem algumas publicações: Quero ver verdejar (2011), Vilarejo-pergaminho do fogo (2010) e Bárbara e a baleia (2010), pela Editora Multifoco, Joana e Altamira (2012 – Cakibooks), Verde Maduro (2012 – Editora Oito e meio) e [Entre colchetes] – 2018 – Editora Patuá. Participou também das seguintes coletâneas: Para Copacabana, com amor (2013 – Editora Oito e meio) e Tente entender o que tento dizer (2018 – Bazar do tempo).
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[Coragem]
Coragem é sair cá de dentro feito rio nascente,
rumo irremediável ao oceano,
teu olhar à espreita destas linhas.
É exercício de riacho deixar-me cair
sobre o deserto branco destas folhas.
A distância longínqua que somos
Merece estas palavras.
Dicionários inertes
esperam, esperam, esperam
até o momento sublime:
um sopro anima de repente
Palavras –
combinação de letras que nomeiam as coisas –
Horizonte dos meus afetos mais profundos.
Quando cantar é preciso,
Porque nada se furta
da face estupefata desta que vos avisa:
Biografia é carimbo de pé e vida.
E não sou eu a contar o tempo
no calendário que carrega os dias.
O tempo é que me conta
no inevitável acontecimento do viver.
*
[Descabimentos]
O tempo cabe nos relógios,
Mas nos descabimentos das histórias de amor
Ele é tão desmedido quanto os deuses.
*
[Entre colchetes]
Quisera um tempo a falar minha língua
E minha língua sobre a tua
A desaguar sobre os lençóis
E nossos beijos transbordassem paz
E ofegantes nossos corpos derramassem luz.
Aos suspiros e sussurros
Toda a Terra estremeceria
Desse mesmo amor
Entre colchetes
Que há em nós.
*
[Cultivo]
Para cultivar o amor
É preciso flor em demasia
Um bocado de poesia
Meninice
E afeto.
É necessário
Ao raiar do dia
Conversar com anjos
Assuntos de formigas e tamanduás
E deixar que o tempo
Na sua sabedoria de palácio
Nos surpreenda
Com o presente gigante
guardado para nós.