Quatro poemas de Gabriel Mação
Gabriel Mação, poeta LGBTQ da zona norte do Rio, inicia sua primeira coletânea de poemas: SUTURA. Sua vocação para a escrita começou em 2014 e já publicou em coletâneas como Seis temas à procura de um poema, organizado pela FLUP e Tente entender o que tendo dizer, organizado por Ramon Nunes Mello. Atualmente, aos 23 anos, é graduando em Museologia, pela UNIRIO. Gabriel faz de seus versos um ato político, um grito de resistência.
***
POR AMAR UM HOMEM
A pedra em meu estômago
Afunda oceano abaixo
E sobre a mesa de jantar
Eu, repartido em pedaços
No prato
No garfo
Na boca deles
Escorrendo o sangue
Por amar um homem
Eu, a impura
Bicha Imoral
Que escuta os murmúrios
As piadas, os insultos
Que envergonha os pais
E recebe gratuitamente facadas
Banhadas em cuspe e palavras
De ódio
Por amar um homem
Eu, que tenho meu sangue
Rejeitado no Hemorio
Mas sangro até a morte
Por amar um homem
Eu, que não posso beijar
Em público o homem que amo
Que não posso
Andar de mãos dadas
Por ter medo de levar pedradas
Eu, o único sentado
Ao lado de um banco vazio
No ônibus
Depois de ser expulso
De qualquer lugar
Por amar um homem
Eu, que não mereço ter um
Pau que goza dentro de um homem
Por amar um homem
E deveria ser espancado
Por foder todas as noite
Com um homem
E não reproduzir
Eu, que todos os dias
Sou aquilo que as crianças
Não devem ser quando crescer
Eu, que morro a cada 25 horas
E morro quando esse poema termina
Ou quando ele começa
Morro
Morro
E vivo
Vivo como se fosse o último dia
Ou o único que resta
E ainda assim morro
Gay, viado, bixa…
Morro amando o meu homem
Ou quem eu quiser amar
Pois o ódio deles
Não pode mudar o que sou.
*
VÍSCERAS AOS ABUTRES
Há corpos pela cidade
Corpos carregados em sacolas plásticas
Carregados em ônibus lotados
Em ruas enferrujadas
C-o-s-t-u-r-a- de -p-e-l-e- s-u-a-d-a -e -o-l-h-a-r -c-a-n-s-a-d-o
Rígidos escravos
Em pernas cegas
Extensão dos vagões de aço
Em todas as camadas
Do peito aberto
Vísceras aos abutres
E todos as criaturas
Que devoram a carne podre
[O rato mais velho ou doente é o primeiro enviado
Para provar o novo alimento
Como ele morre logo depois de comer
Os demais ratos vão embora]
O que é a vida quando esmagada
Com sapatos apertados
Chinelos gastos
Pés descalços
Como baratas e cabeças de ratazanas e camundongos?
O que é a vida que foi tirada
dos que confessaram amar?
Qual valor tinha a vida dos poetas
Mortos antes mesmo de saberem
Que eram poetas?
E a vida dos que foram mortos
Sem mesmo serem donos de suas próprias vidas?
Tentando ser…
Flor no asfalto
Quem será capaz de te ver
Antes de ser arrancada e vendida
Para enriquecer qualquer escravocrata moderno?
Sangue
Essa cor que tem as flores
As árvores mesmo secas
As mãos cicatrizando
Os sorrisos
Quando lembramos deles
Sangram
Esses corpos que caminham
Pela cidade
*
TROFÉU
No relógio 30 minutos
Para descascar os morros
Que vejo da rua
Você consegue não chorar descascando cebolas?
Enche os dentes de água
Maré, Avenida Brasil
Espinha de peixe frito
Jiló à kilo e restos de frutas
Que ninguém comprou
Pisoteadas
Cuidado para não tropeçar
Em crianças pedindo moedas
Pedindo pai mãe arroz feijão
Como língua de boi mastigada
Na feira
Cabeça de porco
Enche a boca de porco
de porcos leitões
Ocupa todos os buracos
Mordidas obturações gastas céu da boca
Eu matei o porco
Agora cospe
*
CAÇADA
Felinos caçam debaixo dos postes
Na cidade
Multidões enchem as ruas
Em meu peito o vazio
Espaços dissolvidos
Entre o intervalo das horas
Há fome nas criaturas
Há fome no mundo
Teu corpo já não está
Sobre o meu
Os homens buscando
A carne fresca
Para devorar numa única noite
Espreitam na floresta
De plástico e gás carbônico
Os predadores
Prontos para dar seu urro
De vitória
Com as unhas sujas
Cravadas na superfície
Desse corpo rígido
Homens urrando o gozo
O pau rígido
Até a última gota de prazer
O cessar é uma despedida
Trágica e rápida
Mas já esperada
Para o fim da caçada
Hilda curcIo
Gabriel macao q poeta voce e. Seu texto e muito intenso e especial, poedia pura. Parabens
Felipe Lima
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