Quatro poemas de Isabela Sancho
Isabela Sancho nasceu no interior de São Paulo em 1989. Estudou artes e se formou em arquitetura. Escreve, desenha, modela bonecas e projeta jardins. As flores se recusam, seu primeiro livro de poemas, foi publicado em 2018 pela Editora Patuá.
***
O sol atrasado
Inchadas de hibernação,
as árvores estão exaustas
do descanso compulsório.
Veja só que estrago
para a primavera –
os botões até entortaram
na contorcida de não virem à tona.
*
Pisa suavemente os musgos.
São tão macios
que parecem nada.
Pisoteia o mato pelas canelas.
Se não lhe atinge a altura dos olhos,
não se faz ver.
Puxa os brotos
um a um e pelos talos
que ainda não existiam.
Só estavam prestes.
Arrasta os bulbos pelos cabelos.
Faz seu bem pela raiz.
As ervas resistentes,
arranca junto com a terra
acusando de daninhas.
*
As árvores carinhosas,
o dia duradouro.
A lágrima do seio,
as gotas de coceira.
As sobrancelhas apertadas,
o pulso nas têmporas.
A canção dos pernilongos,
a invisibilidade brava.
O subsolo ao chão,
a autoafirmação das baratas.
Mangas e mamões,
o podre feito doce.
A fome de goles,
a água benta.
A pele carregada,
a distância do fôlego.
O visco do amor
evaporado até a irrelevância.
A febre das paredes,
o sono de uma demente.
A misericórdia dos trovões,
peço uma destruição –
é bela a tempestade.
*
Quero ser inalada pela flor e picada pelo inseto.
Perturbar uma poça.
Quebrar um osso.
Fraturar um galho
que não me leve a mal.
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