Quatro poemas de Luana Claro
Luana Claro nasceu no outono de 1994 e é autora do livro de poemas e ilustrações Diadorim, publicado em 2017 pela Editora Patuá. Atualmente é graduanda do curso de Letras na Universidade de São Paulo e pesquisadora do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da mesma universidade.
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o ruído da porta rangendo
ecoa vindo do fundo da mente
mesmo de olhos fechados
há o fato irreversível inegável
é preciso coragem
para encarar a entreaberta
porta seu feixe de luz
suas infinitas possibilidades
e da minha visão
metade é escuridão e
metade é amanhecer e
muito me faz falta a fé
para crer sem ver
nos contornos do invisível
*
hoje quase peguei o ônibus errado duas vezes e isso
invocou em mim as ruas labirínticas da cidade
em que o céu se desmancha
em escuridão nascente
a confusão que fiz com os nomes
não será perdoada
a memória anda ruim para coisas boas e pequenas
repentinamente a pequenez das coisas é o que importa
as pequenas ruas da cidade
penso no átimo que existe entre o acerto e o erro
em como posso entender os meandros do tempo
quem sabe pegar o ônibus errado
numa viela qualquer esbarrar no grande maléfico
entender os desígnios do invisível
compreender o que seus contornos me mostram, por fim
ah, como queria poder colocar
o coração no bolso
me desaparecer de mim
numa viela qualquer
*
o tempo constrói lentamente
um monumento entre nós
seus meandros são um mistério
tua figura solar se delineia contra o desconhecido
tua figura solar encarna por vezes o inexplorado
em que lar repousa teu pensamento
e quanto perdeu-se de ti
pelas veredas que a muito contento
teus olhos vislumbraram
de mim, quanto havia em ti
do meu amor,
quanto ficou pelo caminho
quanto ainda resta
quanto é necessário
quanto havia no teu pensar
quanto havia na tua ideia de lar
quanto havia na tua volta
tua figura solar me faz lembrar
dos pássaros, do pássaro que parte
para norte ou sul, indelével
e que nunca é o mesmo quando volta
*
lembro quando pequena
da jaqueta vermelha
ou era amarela?
tingi minha intenção
de azul anis
era apenas mais um corpo
na cidade do sol
mas minha vontade era púrpura
e meu desejo, vermelho
lembro da camada que por costume
sucessivamente depositamos
sobre a parede da memória
era amarela ou verde?