Quatro poemas de Virna Teixeira
Virna Teixeira (Fortaleza, 1971) é poeta, tradutora, editora. Publicou vários livros e plaquetes de poesia no Brasil e exterior. Virna vive em Londres, onde trabalha com psiquiatria. Ela é editora da revista online Theodora e do selo independente Carnaval Press. Sua próxima coleção de poesia, My Doll and I, sairá este semestre pela Lumme Editor. Ela prepara também um livros de contos.
Os poemas abaixo são inéditos.
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O seu próprio lockdown pessoal. Você está num lockdown há anos. É um lockdown duplo. Você e você. Seu retrato estava pintado pela metade e trancado em algum sótão distante. No banheiro você está vestida com uma fantasia de Alice e uma peruca de Barbarella, cheia de cobras artificiais como cabelo de medusa, tentando lembrar como você foi retratada naqueles rabiscos. Você está ligando para alguém, e você está com medo de olhar no espelho. Você pode ser transformada em pedra. O quarto é pequeno, confinado, com pilhas de fantasias bloqueando o corredor. Há uma pessoa dormindo, ferida, na sua cama. Então a porta se abre. Uma pantera negra entra no quarto, caminhando lentamente. Ela veio libertar o seu espirito selvagem.
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Estas passagens secretas conduzem a labirintos, a escadas e estranhos quartos onde você pode se perder facilmente. O veludo vermelho, o salão de baile, mangas bufantes, faces desconhecidas atrás de máscaras. Adictos conhecem todo tipo de truques. Aquela imagem é uma miragem. Você é consumida por um incêndio que começa com a ignicão de uma centelha. Fantasia. Glitter dourado. É uma chama lenta, como um eclipse solar. Permita-se ser iluminada. É o toque de Midas. Por trás do esplendor, há sempre uma sombra densa. E é na escuridão que você pode encontrar seu precioso ouro.
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Imersão, filtro azulado. Jantando no terraço de uma ilha longínqua, as luzes dos barcos piscando. Sereia que mergulha na tela escura da noite, pérola negra do Mediterrâneo, cenários de fantasia. Mas a vida não era fantasia, era real a renda negra do vestido, a seda. O cálice de passito, as videiras. Diferente deste torpor químico, medo que se esconde volátil em azul potente. No meio da névoa dissipa vapores. Apneia de mergulho na banheira, cianose. Nada além de aroma, ilusão, fragrância de looners. O container de hélio vazio, e um balão turquesa metalizado, flutuando na abóbada.
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Evitação de proximidade. Quando ele enviou uma mensagem para ela, ela se afastou. Digam para ela que tomamos esta decisão. O que ela perde durante os lanches. Daremos um bolus de compact. Alguns estão usando suéteres, a mulher com o cabelo longo castanho e meias estranhas está tomando notas. O diário dela é arrumadinho, as notas são simétricas. Por quê você tem medo de completar as refeições? O ultimo episódio me assustou. O sonho onde ela nadava na psicina durante o inverno. Perdendo o controle das emoções contidas. Cenas de Dark, a camisa de Regina Tiedemann. O background negro com penas, combinando com os brincos. Lute ou fuja. A anorexia de intimidade é a sua zona de conforto, mas você se excede eventualmente. Secretamente, caminhando por corredores sombrios com poltronas florais.