Seis poemas de Igor Ramos
Estudante de licenciatura em Linguagens pela Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). Com 28 anos, Igor Ramos é o fruto da Reforma Agrária. Hoje residindo em Porto Seguro, BA, o Poeta e Escritor, foi publicado em 2021 pela Ed. Ipêamarelo, na antologia, Do que ainda nos sobra da guerra e outros versos pretos. Em suas escritas, o autor retrata sobre a sua infância, na lavoura, onde viveu com sua família, por muito tempo, na Zona Rural de Guaratinga, cidade localizada no Extremo Sul da Bahia, com população estimada em 20.700 pessoas em 2020.
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Origens
Sou o filho de Eliene
De Manoel Severino
Do rio do peixe
Do Lagedo Bonito
Fi de preto e nordestinos
Guerreiro desde menino
Arteiro e extrovertido
Meu apelido é Santo Igor
Criado no mei do mato
Debaixo de um barraco
Coberto de lona azul
Zona rural do Guaratinga
Depois de São João do Sul
Conheço das flores
De gente e amores
Minha ferramenta é uma caneta
Mas manjo Cortar de Foice.
*
A vila
Na vila mal assombrada
Quem nela vive
Não vale nada!
No meio da vila assombrada,
Entre um nada e outro nada,
Duas filas de casas,
Que dão no rio, de merda n´água.
Uma vila mal assombrada
De várias merdas
De vários nadas.
* Poema publicado na antologia Do que ainda nos sobra da guerra e outro versos pretos, Ed. Ipêamarelo (2021)
*
Corta Volta
O menino Corta Volta
Para não ir à escola.
Na roça ele se joga,
Lasca lenha, tira leite,
Arranca mandioca,
Pensa num cabrinha bom de bola.
Na linha ninguém o pega
No gol ele decola
Prestativo com os amigos
Corta volta é bom menino
Só não gosta da escola.
*
Reza
O sangue de reis e rainhas Da pele preta
Igual a minha
Me tinge
Me rege
E me protege
*
Durismo
Conheçam nossa Guaratinga,
Grande, pobre, terra rica.
Historicamente, mal dirigida,
E quando chove,
É nas estradas que os carros ficam.
Venham conhecer nossas riquezas,
Contemplar a natureza.
Visite-nos, antes que nos acabem
Olhos d’água estão cegos
Temos muitas represas,
Que cercam a correnteza das águas.
Cachoeiras, poluídas,
A Beleza fica depois de Guaratinga.
Aqui o norte começa no córrego do ouro, Termina no meloso.
Na cachoeira dos Pinheiros,
É folia o ano inteiro.
Já na vila assombrada,
O rio que tem, não vale mais nada.
Se o seu desejo é degustar
Galinha Caipira com Aipim,
Só na cabana Timbokaqui
Fica lá no Pouso Alegre,
Aonde o povo se diverte,
Onde é possível contemplar
O nosso maior espetáculo: o velório do rio Buranhém.
*
Para meu pai
Saudade, Chinês
Sinto saudade do seu sotaque Seus ditados populares
Me lembro bem de nós
Da sua linda voz
Do nosso barraco
E do nosso cachorro Feroz.
Sua partida me fez chorar
Mas você soube bem,
Me preparar
Sabia que o dia haveria de chegar.
Sua história está na memória Ninguém vai apagar
Sua luta continua
Meu guerrilheiro preto
Pois aprendi o caminho
Que devo trilhar.