Seis poemas de Paulo Sérgio de Souza Jr.
Paulo Sérgio de Souza Jr., sul-mineiro, é psicanalista e tradutor na cidade de São Paulo. Bacharel e doutor em linguística pela Unicamp, fez pós-doutorado na UFRJ e atuou como professor-associado na UAIC de Iaşi e como tradutor residente no ICR de Bucareste. Os poemas a seguir são todos inéditos.
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inconfidência
entre o dito e o feito
o meu descuido
teu desajeito
tua cama fria
meu contrafeito
mas quem nunca fez desfeita?
o que de nós não teve peito
ficou
—
entredito
e o feito,
o feito ficou.
*
varal
penduro aqui este poema ao sol
enquanto engomo o verbo já extinto
no sangue ralo dos sentimentais
esfrego à mão essa paixão vencida
pura umidade que só franze o tino
ao sol eu quaro e tiro toda ruga
mas faço disso portas transparentes
de um papel que é tão ralo e firme
que agrada míopes algo incidentais
pregando nelas os seus olhos rentes
*
calendulário
nos teus pensamentos é dia
de folga.
nos meus pensamentos o dia é
de feira.
*
mancia
a cigana profetiza
linha mão anel e ouro
que do dente o brilho é fato
tanto quanto o mau agouro:
teu estilo é destilado
teu destino, lado errado
tua morte é rente ao tato
e a doença, teu tesouro.
*
ladainha
lá vêm aqueles
que aventam no traço
ligeiro do vento
que ao vento se traça
deixando na troça
memórias do bento
quermesse do ócio.
passeiam no vento
o vento que traça
o vento que rosna
o dia que acaba
o nome da rosa
bendito o vento que mora
no tempo
do tempo perdido no bento
e ao vento deixando-
se quando for hora.
*
maxilar
eu vi meia boca
de gente que
sente piedade de nada
que sente da gente.
alarde!
botando a boca
no mundo
de meia boca contente,
vi que o sorriso é descarte;
que a tarde não ia pra frente.
eu vim meia-boca
pro mundo.