Seis poemas de Simone Brantes
Simone Brantes (Nova Friburgo, 1963) é uma poeta brasileira. Publicou Pastilhas brancas (1999, 7Letras), No caminho de Suam (2002, Moby-Dick) e Quase todas as noites (2016, 7Letras), pelo qual recebeu o Prêmio Jabuti de Poesia 2017.
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Meus mortos não estão encarapitados
no alto das árvores
não são eles que balançam
os galhos quando eu passo nos dias de calmaria
não estão debaixo da terra nem voam pálidos
sobre minha cabeça debaixo do céu azul
Aparecem nos sonhos e desaparecem
quando são cinco ou seis da manhã
meus mortos são covardes
não têm coragem
de viver
(De Quase todas as noites [2016, 7Letras])
*
Die Aufgabe
Chegar em casa um pouco mais
do que cansada e puxar ainda assim
e aos poucos o fio longo da mortalha
até fazer da noite sair enfim um dia
dentre todos os dias a morrer na praia
(De Quase todas as noites [2016, 7Letras])
*
Vingança
Os poetas giram em torno das raparigas
em flor.
Mas eles são pesados e elas
tão leves: já não há chão sob seus pés delicados.
Lá em cima transfiguradas, elas gozam, gozam, gozam
(deles ou esquecidas deles?)
Eles estão rubros, estão roxos
(de raiva, de vergonha?).
Os poetas estão dando as costas,
os poetas estão voltando para casa,
estão arquitetando em silêncio o seu plano
de vingança:
querem gozar sem as moças,
querem florir em seus versos
como raparigas em flor.
“As moças vão casar e não é com você”
Carlos Drummond de Andrade
(De Pastilhas brancas [1999, 7Letras])
*
Lapso
Um homem tira um grito das tripas,
do seu flautim medonho,
enquanto esfrega seu sexo contra a porta
do carro — pau e porra lhe pesando,
terríveis como poderíamos sentir se
por um acaso se tornasse
de um dolorido espanto este lapso:
não saber o que fazer com o que cai
de repente em nossas mãos.
(De Pastilhas brancas [1999, 7Letras])
*
Um acontecimento,
não fica perdido para sempre, um dia ressurge,
como esses corpos afogados que, depois de algum tempo
no fundo, reaparecem à superfície, boiando.
E então já não há mais nada a fazer, senão enterrá-lo em poema
sem reza, sem pompa, sem flores,
e, cumprida a obrigação, com este ao menos,
dormir um pouco, enquanto ainda temos
algum tempo.
(De Pastilhas brancas [1999, 7Letras])
*
Pastilhas brancas
Dormi calma por duas pastilhas brancas embalada,
como quem não tem ocupada a alma por tudo que dói.
Talvez, apartada de mim, minha dor tenha andado por aí perdida
ou tenha ficado o tempo todo aqui bem próxima
estendida sobre a cadeira
como essas roupas que se despem na véspera
e se vestem sem pudor no dia seguinte.
(De Pastilhas brancas [1999, 7Letras])
MÔNICA fERNANES
MEU DEUS DO CÉU, QUE POEMAS LINDOS.