Sete poemas de Artur Gomes
Artur Gomes é poeta, ator, videomaker e produtor cultural. Tem diversos livros publicados, sendo os mais recentes Juras Secretas (Editora Penalux, 2018) e Pátria A(r)mada (Editora Desconcertos, 2019). Dirigiu a Oficina de Artes Cênicas do Instituto Federal Fluminense em Campos dos Goytacazes-RJ de 1975 a 2002. Em 1983, criou o projeto Mostra Visual de Poesia Brasileira e, em 1993, idealizou o projeto Mostra Visual de Poesia Brasileira Mário de Andrade — 100 anos — realizada pelo SESC São Paulo. Em 1995 criou o Projeto Retalhos Imortais do SerAfim – Oswald de Andrade Nada Sabia de Mim, executado pelo SESC-SP em vários unidades na capital e pelo Estado. Em 1999, criou o FestCampos de Poesia Falada. Atualmente, leciona Poéticas no Curso Livre de Teatro em Campos dos Goytacazes-RJ e coordena o Sarau Santa Balbúrdia, na Casa Criativa Santa Paciência, e o Sarau Balbúrdia Poética, na La Taberna de Laura em Copacabana – Rio de Janeiro. Acaba de gravar no home studio Fil Buc — Produções o disco Poesia Para Desconcertos, com produção de seu filho Filipe Gomes Buchaul. Em 2020 lança o livro O Poeta Enquanto Coisa pela Editora Penalux e desenvolve o projeto para livro O Homem Com A Flor Na Boca – Com Os Dentes Cravados Na Memória, com para o selo Fulinaíma MultiProjetos.
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Jura Secreta – revisitada
não fosse essa jura secreta
mesmo se fosse e eu não falasse
com esse punhal de prata
carne de sol – na lata
teu suor entre meus dedos
o sal sob o teu vestido
o sangue no fluxo sagrado
sem nenhum segredo
esse relógio apontado pra lua
teu corpo em pelo – Nu – a carne crua
não fosse essa jura secreta
mesmo se fosse eu não dissesse
essa ostra no mar das tuas pernas
não seria justo
como um conto do Marquês de Sade
no silêncio logo depois do susto
*
SagaraNAgens Fulinaímicas
guima meu mestre guima
em mil perdões eu vos peço
por esta obra encarnada
na carne cabra da peste
da hygia ferreira bem casta
aqui nas bandas do leste
a fome de carne é madrasta
ave palavra profana
cabala que vos fazia
veredas em mais sagaranas
a morte em vidas severinas
tal qual antropofagia
teu grande serTão vou cumer
nem joão cabral severino
nem virgulino de matraca
nem meu padrinho de pia
me ensinou usar faca
ou da palavra o fazer
a ferramenta que afino
roubei do meste drummundo
que o diabo giramundo
é o narciso do meu Ser
*
veraCidade
por quê trancar as portas
tentar proibir as entradas
se já habito os teus cinco sentidos
e as janelas estão escancaradas ?
um beija flor risca no espaço
algumas letras de um alfabeto grego
signo de comunicação indecifrável
eu tenho fome de terra e esse asfalto
sob a sola dos meus pés agulha nos meus dedos
quando piso na Augusta
o poema dá um tapa na cara da Paulista
flutuar na zona do perigo entre o real e o imaginário
João Guimarães Rosa Caio Prado Martins Fontes
um bacanal de ruas tortas
eu não sou flor que se cheire
nem mofo de língua morta
o correto deixei na Cacomanga
matagal onde nasci
com os seus dentes de concreto
São Paulo é quem me devora
e selvagem devolvo a dentada
na carne da rua Aurora
*
pontal.foto.grafia
Aqui,
redes em pânico pescam esqueletos no mar
esquadras – descobrimento espinhas de peixe convento
cabrálias esperas relento escamas secas no prato
e um cheiro podre no AR
caranguejos explodem mangues em pólvora
Ovo de Colombo quebrado
areia branca inferno livre
Rimbaud – África virgem
carne na cruz dos escombros
trapos balançam varais
telhados bóiam nas ondas
tijolos afundando náufragos
último suspiro da bomba na boca incerta da barra
esgoto fétido do mundo grafando lentes na marra
imagens daqui saqueadas Jerusalém pagã visitada
Atafona.Pontal.Grussaí
as crianças são testemunhas:
Jesus Cristo não passou por aqui
Miles Davis fisgou na agulha
Oscar no foco de palha
cobra de vidro sangue na fagulha
carne de peixe maracangalha
que mar eu bebo na telha
que a minha língua não tralha?
penúltima dose de pólvora
palmeira subindo a maralha
punhal trincheira na trilha
cortando o pano a navalha
fatal daqui Pernambuco
Atafona.Pontal.Grussaí
as crianças são testemunhas:
Mallarmè passou por aqui.
bebo teu fato em fogo
punhal na ova do bar
palhoças ao sol fevereiro
aluga-se teu brejo no mar
o preço nem Deus nem sabre
sementes de bagre no porto
a porca no sujo quintal
plástico de lixo nos mangues
que mar eu bebo afinal?
*
injúria secreta
Suassuna no teu corpo
couro de cor compadecida
Ariano sábio e louco
inaugura em mim a vida
Pedra do Reino no riacho
gumes de atalhos na pedreira
menina dos brincos de pérola
pétala na mola do moinho
palavra acesa na fogueira
pós os ismos tudo e pós na pele ou nas aranhas
na carne ou nos lençóis no palco ou no cinema
a palavra que procuro é clara quando não é gema
até furar os meus olhos com alguma cascata de luz
devassa em mim quando transcende
lamparina que acende
e transforma em mel o que antes era pus
*
pele grafia
meus lábios em teus ouvidos
flechas netuno cupido
a faca na língua a língua na faca
a febre em patas de vaca
as unhas sujas de Lorca
cebola pré sal com pimenta
tempero sabre de fogo
na tua língua com coentro
qualquer paixão re/invento
o corpo/mar quando agita
na preamar arrebenta
espuma esperma semeia
sementes letra por letra
na bruma branca da areia
sem pensar qualquer sentido
grafito em teu corpo despido
poemas na lua cheia
*
goytacá boy
gravada no CD fulinaíma sax blues poesia (2002)
ando por são Paulo meio Araraquara
a pele índia do meu corpo
concha de sangue em tua veia
sangrada ao sol na carne clara
juntei meu goytacá teu guarani
tupy or not tupy
não foi a língua que ouvi
em tua boca caiçara
para falar para lamber para lembrar
da sua língua arco íris litoral
como colar de uiara
é que eu choro como a chuva curuminha
mineral da mais profunda
lágrima que mãe chorara
para roçar para provar para tocar
na sua pele urucun de carne e osso
a minha língua tara
sonha cumer do teu almoço
e ainda como um doido curuminha
a lamber o chão que restou da Guanabara
TANUSSI CARDOSO
Artur Gomes É dos maiores poetas BRASILEIROS contemporâneos. PARABÉNS pela PUBLICAÇÃO de seus poemas. ABRAÇOS a todos.
André bianc
Sem dúvida, uns dos grandes poetas CONTEMPORÂNEO. parabéns pela publicação. andré bianc