Sete poemas de Mô Ribeiro
Mô Ribeiro ou Mônica Ribeiro é mineira de Belo Horizonte. Arquiteta de formação, descobriu-se poeta por insistência do inconsciente. Participou da antologia É Urgente o Amor, Edições Vieira da Silva, Portugal, e também da Antologia Ruínas, da Editora Patuá. Foi publicada pelas revistas Caliban, Desvario, Germina, Literatura & Fechadura, Mallarmargens, Mirada e Revista de Ouro, entre outras. Irá publicar, ainda este ano, seu primeiro livro de poemas, Paganíssima Trindade, pela Editora Penalux. Nasceu em 1971 e deu trabalho para vir à tona: o parto foi de fórceps. A escrita, ao contrário, vem nas contrações que dão à luz seus poemas. Partos rápidos, mas não sem dor, e depois o cuidado com a cria. Assim é sua escrita.
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SAPIÊNCIA
Quando é
que ela vai saber
que as pernas soltas
não andarão?
Quando é
que ela vai saber
que a tela
é falsa fraca?
Quando é
que ela vai saber
que o sonho contido
fortalece a tela?
Quando é
que ela vai saber
que o andar se dá
é na cabeça?
Ela empurra a tela:
quer rasgá-la
Da tela imagina tecido macio
Quer carícia
Quer cara no vento
O que eu vejo
é desalento
Como é
que ela vai saber?
*
ESTÁTUA DE SAL
O que ela foi
ficou carimbado:
sombra móvel
no chão do tempo
Há ventania agora
O balanço
porém
tornou-se imóvel:
estátua de sal
ela ousou olhar para trás
*
PATRIARCADO
Um deus covarde me pariu
por meio de uma virgem
Não teve coragem de me parir ele mesmo
O hímen não se rompeu
mas eu rompi com deus
*
MAXILAR
Meus dentes
são entes
de osso
Os de cima
nos de baixo
em desalinho
Maxilar desrepousado:
sempre!
Quando durmo:
pesadelo!
Range a cabeça
Acordo:
duros os ombros
bambos os dentes
Maxilar meu:
por favor
se assente
*
CAIM MATOU ABEL
O cutelo cortou o pensamento ao meio
Gêmeos
um de dor
outro de folia
A cabeça mãe sofrendo
não se dava o direito de escolher
um dos filhos:
o dilema de Sophia
*
PARTIDA
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amiga do anestesista rei
Lá tenho o adormecer que eu quero
Na maca que não escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Terei o decolar do sono
E o pouso da volta à consciência
Lá tenho a ida e a vinda que eu quero
E de maca andarei
Vou-me embora pra Pasárgada
E na volta parar eu não sei
Então escreverei
Escreverei
Escreverei
Vou-me embora pra Pasárgada
*
Dedilho os fios do meu cabelo
como se fossem cordas de violão
Som não sai
mas a sensação
a sensação
Os fios se mexem e acariciam a cabeça
que sente
A cabeça sente muito
e pensa muito
e ao penar sente
e ao sentir pensa
Fica nesse
vai lá vem cá
sempre
ou quase sempre
Às vezes trava
faz greve de silêncio
sem pedir benefício
Só greveia mesmo
no silêncio
Quando adormece
vem o sonho
fura a greve a cabeça
e sente
e pensa
e sente
e acorda sem saber
o que pensar
do que o sonho pensou
Walter muller
Que lindo Te Ver Na Ruido Manifesto!