Três poemas de Felipe Moreno
Felipe Moreno nasceu em São Paulo, em 1993. Formado em Rádio, TV e Vídeo pela FIAM-FAAM, publica, periodicamente, nas revistas digitais New Order, Revista Subjetiva e Fazia Poesia. Atualmente, reside em Florianópolis.
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ao nada
o mistério:
foi embalsamado num
pote de vidro e jogado
às traças
na última prateleira
junto a outras
tralhas
no quartinho sujo
e malcuidado
do nosso inconsciente.
filosofia natimorta –
ou antes abortada:
arrancada das entranhas
onde pululavam
as questões fundamentais
e agora
mais que qualquer período
tóxicas
anestesiadas
nossas entranhas não gestam
qualquer hipótese
mas antes digerem
e grunhem
trash food
comidas congeladas
barras de chocolate.
do que tange o insondável:
fechamos os olhos
e abrimos outros
reconfigurados
novos
e
plasmados com o digital
recebemos mensagens
em grupos de conversa –
“bom dia”
“boa tarde”
“boa noite”
notícias falsas
risadas.
angústia existencial:
antes aprofundada
(para ver se no fundo há enlevos)
foi
aos poucos
amainada
(nosso propósito é o dopping):
contra a fissura
do absoluto
ante o cisma
da grande questão
nossa terapia é
responder a e-mails
frequentar reuniões
olhar-se no espelho
sacar dinheiro
ir ao shopping
distribuir like e
mascar chicletes.
*
subcutâneo
subcutâneo
em ti
pra sentir com o tato
seu lado oculto
e pra sentir com a boca
seu lado doce.
melanina molhada:
mela minha boca com seus
lábios debaixo e
me pergunta o que é que
eu acho
de todo esse relaxo
de braços e
coxas
nesse movimento lento e
sem chão
nesse mesmo colchão
de travesseiros e
colchas
feromônio nas
fronhas
nessa mesma cama
em que transpiro e
ardo
troco o tom
suspiro e
me desfaço.
nenhum toque é
gesto falho
mas antes dádiva:
gemo em polpa.
*
(sem título)
ternura e solidão:
minha vida
íngreme
para baixo
escoando
pelo ralo
do verso e
da fruta
doce
pendida
na árvore
quieta
sob o sol
que não castiga
mas impera.
minha vida
digerida
em tons
de minúcias
fagulhas
minúsculas
carinhos
e tudo aquilo que está
a altura
dos pés
no máximo
dos olhos
uma vez que
tudo aquilo que está
além do que sente
os pés
e o que vê
os olhos
é falso.