Um poema de Maia Ronchi
Maia Ronchi é uma cidadã do mundo, uma grande fã de vídeo games e arquitetura, apaixonada por gatos, tatuagens e portas.
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Você é uma criança, é ingênua, é pura.
O seu ursinho é o dobro do seu tamanho, cada abraço é uma certeza de que tudo vai ficar bem, uma certeza que tudo está bem. Cuidar do ursinho é cuidar de si. Toda criança tem um ursinho de pelúcia, toda criança ama seu ursinho. Para muitas ele significa segurança, ele é proteção, é amor.
Até que o ursinho não é mais de pelúcia.
Não lhe proporciona mais amor.
Não lhe proporciona mais segurança.
Não lhe proporciona mais proteção.
Seu abraço não tem o calor que lhe aquecia a alma.
O ursinho não é mais de pelúcia.
É dor.
É vergonha.
É medo.
O carinho é recebido, mas é a força. Ainda se chama carinho quando não se quer recebê-lo? Quando o carinho se tornou tão penoso? Quando tudo mudou? Quando o medo tornou-se constante? Quando aquele que te protegia se tornou aquilo que te ameaçava? Quando aquilo que te fazia tão bem começou a te deixar tão mal? Quando chorar todo dia tornou-se normal?
Não é mais de pelúcia.
Você não é mais criança, não é ingênua, não é pura.
Você diz não.
Você treme.
Você chora.
Você pede para parar.
Você implora.
O gosto de teu pelo em meio aos beijos começa a causar uma aversão, asco, medo. O beijo não é mais beijo, não é mais puro. O beijo te tornou suja. As mãos que te afagavam agora te violam.
Não é mais pelúcia, é apenas urso, é apenas pelo.
Você tenta fugir, mas o seu urso é o dobro do seu tamanho. Seu abraço é apertado, suas palavras são afiadas, cada uma que sai de sua boca, antes macia e amorosa, é agora um corte na alma.
Não tem como fugir
Por que não é mais pelúcia
É apenas urso.