Três poemas de Marcos Samuel Costa
Marcos Samuel Costa nasceu dia 07/12/1994 em Ponta de Pedras, Ilha de Marajó, Pará, Amazônia brasileira. Atualmente mora em Belém do Pará e cursa Serviço Social na Universidade Federal do Pará. Publicou alguns livros de poemas, entre eles Uma semana de poesia (Ed. Penalux, 2016), Sentimentos de um século 21 (Ed. Multifoco, 2014) e Semblantes de nós (coautoria com Ana Meireles, Ed. Folheando, 2018), e o infantil Memórias quase póstumas de um pato, escrito em parceria com Miriam Hanna Daher. Publicou em diversas revistas, como G.u.e.t.o., mallarmargens e marinatambalo, publicou também em mais de 20 antologias literárias entre elas I, II, III & IV Anuário da Poesia Paraense. Faz parte da equipe Editorial do Jornal Crescendo, onde assina a matéria de capa e a coluna de crônicas infantis. Marcos escreve poesia, contos, crônicas e romances.
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Dentro da laranja caída
Dentro da laranja caída,
canções que poderiam gerar aves
– mergulho seco dentro do sumo
desumano,
v e g e tal ex is tên cia.
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As sombras das árvores comem toda a minha fome
Frente ao espelho, dentes amarelos à mostra,
veias rubras ao rosto – como um jambo podre,
formigas que atravessam o açúcar – mergulho sombrio
sobre o gosto do infame pecado da gula,
vestia-me de outros pecados,
cansado de minhas roupas sujas
– neste quintal-de-tempo, as sombras das árvores
comem toda a minha fome
morro magro, sem carne, despido feito anjo,
sombras escuras entre os limites da costela –
arcanjo no rosto, a perna ausente da ave que
caminha no chão de madeira,
tábuas que sentem as dores de seu batucar – toque
toque toque toque,
galinha sem penas nas costas, a fome que sibilou-se
fora das pautas, morro magro e sem carne.
*
Todos nós
A arquitetura encontrada na cozinha de minha casa
lembra um pouco o movimento do corpo de um caramujo,
igarapé que corta
a coluna principal de nosso sustento,
mesa de pernas tortas
sem brilho, sem mármore,
sem a tinta que colori a profundidade
que é a alma de minha mãe,
teias de aranha nas paredes e teto,
telhas de um passado tão distante.
Sentados todos, vésperas dos ventos mórbidos,
meu pai vinha com suas
redes de pesca envolvida mutuamente em seus olhos
– peixes mergulhavam por todo o piso da casa,
era hora de cortar os temperos
– chicória que recendia
toda carne branca do peixe.
Minha mãe tardava em suas palavras,
eram poucas, impressão azulada,
olhos miúdos – catam do leme do barco
musgo para rebocar as lacunas abertas,
sempre, o sempre era nossa matemática,
nossa língua, identidade apresentada
as questões oficiais, podiam ouvir de todos nós
– aquela mamãe.