Três poemas de Matheus José Mineiro
Matheus José Mineiro, 1988, nascido e criado na Zona da Mata de Minas Gerais, autor dos livros A Cachoeira do Poema Na Fazenda do Seu Astral/Selo Tomate Seco: 2013, Poemas Na Galáxia Pupila/Editora Urutau: 2016, Utensílios de Resiliência e Flutuabilidade/Editora Poesia Primata: 2017. Confecciona o fanzine de colagens Radiografia do Caos e da Calma. Integrante da Oficina de Experimentação do Poema. Graduando Letras na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri/Diamantina/MG, onde pesquisa lírica e antropologia cultural. Já participou da Off Flip/Paraty/RJ, Poesia F.C/Sesc Campinas/SP, Festival de Inverno de São João Del Rey/MG, Amostra Grátis/Norte Comum/Sesc Rio, Interferência Cultural/Sesc Tijuca/RJ, Oficina Experimental de Poesia/RJ, Festival Literário de Petrópolis/RJ, Mostra Poesia Agora/SP/BA/RJ e de diversas publicações impressas e digitais no Brasil e em Portugal.
***
organismo que tolera o macio e o impacto
engenharia
bioma
ameaçados todos os dias por arcadas dentárias
de tubarões e hipopótamos poucos afetivos
com os pés num solo orgânico
que resiste às mordidas da Grande Indústria
e que fala sobre decomposição e floração numa frase.
daquilo que ainda temos de pluviosidade e de aspereza.
daquela criança yanomami diante da sobrevivência.
vírus, bactérias, sintomas, um território peçonhento…
uma adolescente negra diante do arco íris.
extrai extrato, óleo de citronela, sumo, seiva, calêndula, raiva…
Kali enfrentando um exército de demônios
e depois indo dançar freneticamente com Shiva,
Omulu e Vera Verão.
aquele ponto vermelho inquieto que se observa nas imagens
do satélite
é um indivíduo com a cabeça em chamas
fogueira nômade conturbada pela rotina, pelo estado,
pelo dragão de sete cabeças do apocalipse capítulo 13;
ainda reservatório
de uma energia absurda, estranha, incrível;
potência motriz desse fogo
encharcando ensopando-lhe toda musculatura
*
gente sendo
pomar geobiologicamente débil
topografia íngreme
astronomia de carne e osso
gente é
o relevo acidentado
a localidade de enfrentamentos e probabilidades
a gente
é solo que precisa de adubação e homeopatia
um ambiente de vibrações instáveis
arquitetura adoecida
agricultura de subsistência e teimosia
gente
cor azul em busca de tonalidade e intensidade
gente
timbre, rotação, calefação, uma ecologia de sensações
gente
sendo a delirante migração das borboletas
e dos elefantes africanos
gente
uma fotografia uma escultura que vai tomando corpo
de acordo com as irradiações, confluências, trocas,
colisões e fotossínteses
gente é um fêmur que nunca se torce
gente é solo nutrindo estresse e terapias
cachoeira em territórios coercitivos
gente sendo a tomografia de um órgão persistente
e explorado
incrível usina de não-linearidades
astronomia de carne e osso
calçada onde o mendigo deita
gente
é poema em constante decomposição e floração.
*
a partir de então
meus olhos são dois telescópios castanhos
te avistando
cometa que orbita o estrelário da pupila.
fotografia massoterapêutica
debaixo dos meus cílios
passo a te medir com sextantes, lúmens e volts
certo de que satélites e sondas espaciais tentam captar a estrela que gira a galáxia
cor de colmeia da sua retina.
e que todos os sismógrafos e placas tectônicas se agitam quando a gente se
abraça, que todos os barômetros enlouquecem quando a gente chove e o ganso
plaina e a hélice da usina eólica decola quando a gente passa.
Poeta xandu
Matheus mineiro tu sempre acErta o ésse da queStão: Onde corta a matinha, o rio doce, a lágrima, e o coração só cabe nas pisa do boi – jeito o quê? – Mundo grande!
JJ RIBEIRO
gente
uma fotografia uma escultura que vai tomando corpo
de acordo com as irradiações, confluências, trocas,
colisões e fotossínteses… ( ES CULTURA )