Três poemas de Sergio Maciel
Sergio Maciel (1992) é poeta, tradutor e editor da revista escamandro. É graduando em Letras Clássicas pela Universidade Federal do Paraná. Publicou seu primeiro livro de poemas, ratzara (Dybbuk, 2017), e participou da antologia da Enfermaria 6, os pastéis de nata ali não valem uma beata; seu segundo livro impresso está em vias de publicação. Além disso, é um dos integrantes do grupo de performance Pecora Loca.
***
[…]
a natureza parece verteu-se em novas leis
o curso das águas estanca e buscam as vísceras dos leitos
a única salvação para édipo é não ser salvo
desisti de bom grado de meu reino mas conservo o domínio de mim
o governo de si é o governo supremo
vai virgem despeja terra sobre este tronco pútrido
vai empilha toco em toco e taca fogo que eu me atiro
conduz estes pés à ponta do rochedo ante o pélago
sobre alguma pedra cravarei os pés tortos
direi verbos em sintaxes tensas sobre meus fados
ah quem quer que tenha arado do assírio rei as terras
e suplicante agora adora o bosque onde a serpe
cadmeia junto à dirce sacra se oculta
quem quer que em sorvos e goles sacia a sede no eurotas
que cultiva grãos na esparta dos nobres gêmeos
feito colono que a élida e o parnaso ceifa
e aos prenhes campos beócios lança sementes sob farta chuva
ouve bem o que digo
de tebas o flagelo feito a hera à azinheira atrelou que coisas vis
de tão obscuro quem esclareceria tantos repetidos monstros
pra que perder mais palavras
se toda sílaba salta seca da boca
repõe monstro maior
o mundo que semeei se afoga agora entre meus metacarpos
o leite que bebi materno adentra peçonha o esfenoide e vaza
regurgita-se
zigomático afora qual fosse meu pranto
a morte se espraia por tudo feito erva daninha
invade os peitos ferozes
fácil é colher a vida de um homem
morrer no entanto é que é indivisível
não se furta não falta não finda
mil atalhos se abrem a um corpo pestilento
tudo é sem pele
difícil manso
varar a dor
[…]
[trecho do livro Fenícias]
*
colosseum 63 d.C.
encontrei-me por acaso
no espetáculo do meio-dia
esperando ver algo lúdico salubre
deu-se o avesso disso
são só cansaço a infeccionar derrota
nada têm que os cubra o corpo
expõe aos golpes todo o tronco
a imagem do sangue humano
a solidez dos homens que afastam moscas
*
a desgraça une a todos como bichos
mas logo vem o desgaste
e as palavras seguem
feito corvos
poucos arcam
maior parte busca brecha
na brisa
esgarçando as caras
parecem animais atrás de fuga
os mais ferozes reencontram o desastre
como um cortejo desconjuntado
uns restam mansos
todavia mudos
um areal em marcha
alegria que o dia passa ao dia