Um conto de Maria Vitoria
Maria Vitoria é paulista. Graduanda em Serviço Social, escritora e editora literária. Publicou três livros de maneira independente, entre eles: Meu interior que vos fala (2014), A Estranhamente (2018), Eu Fragmentada (2019). Participou de diversas coletâneas literárias pela editora: Scenariumplural, tendo mais de dez livros publicados com crônicas, contos e poemas seus. Em março de 2019, criou a coletânea: Eu mulher, existo e resisto que reuniu mais de 40 mulheres brasileiras e estrangeiras. É criadora do blog: “A Estranhamente” e costuma publicar além de conteúdos autorais, publicações de outros escritores independentes, além de promover desafios literários, resenhas de livros e dicas de escrita criativa. Atua também, como assessora de projetos na revista: Fazia Poesia e como editora na revista: New Order. Para além das mídias, Maria Vitoria ministra uma oficina de escrita para mulheres no Centro de Referência e Diversidade (CRD). Adora escrever textos sobre critica social, não gosta de café e é fotografa nas horas ímpares.
***
Varrendo os pretos
O sol se mescla em meio a nuvens de chuva. Caminho apática e com o útero em dores pelas calçadas que há anos meus pés tanto percorrem. A vida continua frenética e as pessoas bordam um zigue-zague de forma proporcional.
Duas motos, dois homens brancos de farda, um jovem negro. Ainda era dia, 15:47 em ponto, quando o cano do revólver apalpou bem mais que os bolsos, alisou também o peito, acariciou também a face…
E eu via as pessoas seguindo com suas vidas, apenas atravessando a calçada do enquadro ao preto e olhando, e se desviando, cada vez mais se acostumando, alguns até vibrando e eu ali de mãos atadas carregando apenas livros de elaboração de projeto, tcc e dissertação. Rapaz, como a vida me entristece, me envelhece, mas ao menos me permite escrever sobre as coisas que nunca encontramos numa “tese”.
Sentei para pensar e escrever algumas poucas palavras numa praça que fica situada na entrada de uma favela. Havia crianças se balançando nos equipamentos para ginástica. Havia jovens em suas bikes, em grupos de três ou quatro, dialogando e fumando maconha. Havia latas de lixo por toda a praça, penduradas corretamente e novinhas em folha. O mais engraçado é que há três meses, quando eu vivia contatando a subprefeitura do meu bairro para colocar estas mesmas lixeiras por aqui para que a qualidade de vida e a questão habitacional e recreativa das pessoas que residem na favela ao redor da praça mudasse, nada foi feito.
Estamos em agosto, há apenas dois meses das eleições presidenciais. As ruas são varridas, os pretos são presos e o lixo é colocado no seu devido lugar.
As pessoas se acostumam e seguem apenas seguindo suas vidas. Bom, eu não!