Um miniconto e um poema de Karolaynne Nunes
Karolaynne Nunes é poetisa e discente do curso de Letras Língua Portuguesa e Literaturas da Universidade Federal de Mato Grosso. Sua influência no mundo literário se deu nos livros de filosofia, durante o ensino fundamental; e no ensino médio, teve um contato mais íntimo com outras obras da literatura brasileira e estrangeira, em que se descobriu um ser intenso e apaixonado por todas as literaturas. Ali, nascera o encanto pela silenciosa obra do escritor Álvares de Azevedo, que a fez escrever diversos poemas e textos, com o objetivo futuro de lecionar e lançar um livro, assim, espalhando a literatura pelo mundo.
Primeira colocada na categoria “Conto” do I Prêmio Rodivaldo Ribeiro de Literatura, concurso promovido, neste ano de 2021, pela Ruído Manifesto.
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Cadê Você…?
Quando descobri a causa de nossos corpos entrarem em colapso após aquela batida, eu tive a certeza de que um de nossos corações não sofreria mais tamanha frequência do que era a vida diante de nossas realidades turbulentas. Ademais, eu sempre soube que para a vida não bastava apenas a nossa existência, ela sempre buscava por mais e o nó de nossas essências enfeitaram-se num laço de amor…, amor esse que nunca dependera do acaso ou de outrem, mas sim, de cada um de nós, porque para o amor as duas faces se fazem com a junção de uma única alma, sem sombra de resquícios por detrás de nossas ínfimas memórias. Destarte, lembro-me de vagar a sua espera, mas, cadê você? Cadê você que, está aqui e aí ao mesmo tempo e nem sequer nota minha sublime e itinerante presença?
No dia seguinte, perdi-me de vista, para mim não importava mais saber se a vida se tratava de nós ou simplesmente de minha visão imaginativa das coisas, eu sempre soube que quando nos perdêssemos você seria a última pessoa a me encontrar naquela mesma estrada. Todavia, estar a sua procura fazia com que meu caminho não se tornasse tão míope e sem sentido, pois para mim a sua presença tornara-se então a mais plena, convicta e límpida essência de menina-moça-mulher. Eu sei que não fomos perfeitos um para o outro e, no entanto, eu nunca quis trazer-lhe a perfeição, porque para tal feito eu não sonharia na possibilidade de uma existência ao seu lado…, além disso, aqui estou eu a vagar por um minuto de sua atenção e compaixão, lhe garantindo que, se for para desbravar por este mundo em busca daquilo que não fomos e nem sonhamos ser um para o outro, para mim será totalmente em vão estar a sua procura. Diante disso, me diga se continuará a esconder-se de seus próprios sentimentos, de suas próprias emoções, até quando se esconderá de si mesma? De mim? Cadê você, Sol? Cadê você, Estela? Cadê você, Ariel? Onde estão aquelas faces que em meio ao infinito juravam serem leais a sua integridade? Por que agora que se deixou ir embora levando consigo aquilo de mais precioso que alguém pudera ter? Que eu pudera ter? Por que deixei-me levar por tamanha fantasia abstrata? Por que lancei-me ao mundo atrás de toda sua infinitude…, atrás de mim mesma…, por que deixei-me ir…? Pudera eu ter feito tudo que sonhara antes de (te)partir e (te)deixar ir.
Hoje, eu sei que nada voltará, nem eu, nem você, nem tudo que um dia a vida se propôs a nos dar em meio a toda sua (in)definição e morbidez, deixando-se pegadas espectrais e marcas sem autorias que, um dia, por menor que tenha sido o devaneio, eu desejei a mim mesma. Mas, ainda sim, quero perguntar-me olhando para dentro do que um dia transpareci de forma tão casta e vívida em sucessão a tamanha fúria e a toda tempestade que deixei minhas emoções se desaguarem neste mar de repleta não identidade: Cadê você…?
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A mulher que tornei-me…
A mulher que tornei-me, demorou anos para se reconstruir
Hoje vejo que ser mulher apenas não basta quando não se sabe o que fazer diante do mundo
Ser mulher pode ser palavra, atitude, gesto, sentimento, personificação e, ainda assim,
continuará sendo mulher
Por que há tanta necessidade em tornar-se aquilo que nasceu para ser?
Por que precisam de olhos que as vejam se não olham para si mesmas?
Por que querer tanto o que é capaz de conseguir sozinha?
Nasce-se mulher ou torna-se mulher?
Se nasces, por que não fazes o que é próprio da tua natureza?
Se te tornas, por que não emanar o que aprendes?
Mulher, não exija do outro aquilo que é próprio de você
Mulher, não busque no outro o amor que tens em teu íntimo
Não lute com o outro, lute para si
Se podes construir, então se (re)construa
Se podes viver, então (re)viva
Se podes partilhar, então (com)partilha
Seja una, mas se possível, (re)una
És a única que pode lembrar-se de si mesma, portanto, não espere no/do outro aquilo
que sabes viver em ti e somente em ti.
A necessidade nem sempre carece de opinião, de um alguém, às vezes carece de si mesma.
Não espere surgir uma situação para ver o quão grande é o valor que um dia desejou dar a si
própria.