Um poema de Diego Pansani
Diego Pansani é poeta. Publicou seu primeiro livro, O Amador, em 2018 pela Editora Urutau. Seu segundo livro foi contemplado pelo ProAC-Poesia e será publicado em 2019 . Tem poemas publicados nas revistas eletrônicas Escamandro, Arcádia, Algo deu errado.
O poema abaixo foi concluído em março de 2019.
***
Manda um zap, Bashō
Bashō, aqui nada
de neve ou montanha:
brisa e um par
de reis
com ás
no flop.
Aqui, meu filho, sangram
quentes os olhos dos peixes
no gelo obeso e pervertido
Estamos, obviamente, no terminal
O ônibus cheio de velhos
o vidro de perfume acumula
poeira, poeira e
uma leve esperança alhures
lamber aquelas ancas trêmulas
deixar o vidro estraçalhar a queda
poeira e luz
poeira e luto
um cheiro de tudo, Bashō,
de tudo que em nós foi úmido
um dia.
Bashō, a receita do unguento
que você passou nas pernas
antes de andar pra dentro
da respiração e do refluxo
matinal criar sonoridades, coreografias: Bashō,
enfia ela no cu.
Olha, presta atenção,
aquela cabana
na beira do rio
com as bonecas penduradas
de ponta cabeça
e no varal o seu kimono
laranja dançando:
Ouvimos.
A coreografia do hálito
das 33 penélopes de Bangladesh,
mascando chicletes, todas ao mesmo tempo
da direita para a esquerda:
Ouvimos.
Estamos, ainda, silenciosamente, no terminal
Bashō, uma lanterna prateada requer pilhas grandes e anacrônicas,
100 gramas de Bressan amarelo, um pêssego,
um caderno sem pauta
uma espécie de relicário
de plástico, Bashō, meu bem,
que tempos são esses?
Bashō, o rio
meu deus, o rio,
a cabana precária
sem teto, luminária, náusea, porra nenhuma
e as folhas e tatuagens e lagartas
espalhadas pelo altar onde
deitam os seus sapatos remendados
Bashō, um único banho
morno e você largaria tudo
Basho um banho inesperado
o vapor
o vapor
o vapor, Bashō
Compondo uma película
no carpete de líquens
nos seios e em nossas barrigas
O sotaque, a dicção, Bashō
as argolas precárias
os desígnios absolutos
a ladradura dos nervos sob o vapor esculpindo
o vento.
Estamos no terminal
Bashō, o arrepio do inédito
esplendor dos lábios em silêncio
se contorcendo
na espera da outra película, ali, aqui, logo ali,
nos leporinos. Esqueça.
Bashō, por aqui
domesticamos os pássaros
e colocamos armas nas mãos
de crianças descalças.
Tá foda, Bashō.
Tá foda.
Mas aprenderemos a fazer
Haikai com os intestinos
Dos fascistas, sim senhor.