Uma resenha de Vanessa Maranha
Vanessa Maranha é psicóloga, jornalista e pós-graduada em Psicanálise Lacaniana. Integrou várias antologias de contos, entre elas Mais 30 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira (Record, 2007), organizada por Luiz Ruffato. Em 2001 foi finalista ao Prêmio Guimarães Rosa; em 2004, venceu seleção de contos da Universidade Federal de São João del-Rei. Foi selecionada para as oficinas da Flip em 2010 (Jornalismo Literário), 2012 (Crítica Literária) e 2016 (Shakespeare). Em 2012 venceu o Prêmio Off Flip; no ano seguinte, o Prêmio Ufes de Literatura com o livro Quando não somos mais (Edufes, 2014) e o Prêmio Barueri de Literatura com Oitocentos e sete dias (Multifoco, 2012). Foi finalista ao Prêmio São Paulo de Literatura 2015 com seu romance de estreia Contagem regressiva (Selo Off Flip, 2014). Em 2016 lançou o livro de contos Pássara, pela Patuá. Começa em mar, seu segundo romance, recebeu Menção Honrosa do Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura 2016 e foi finalista ao Prêmio Guarulhos de Literatura 2018. Lançará em 2020 o romance A filha de Mrs. Dalloway, que como projeto participou do Pitching Amazon KDP na FLIP 2017, depois, foi finalista ao Prêmio de Incentivo à Publicação Literária, 100 Anos da Semana de Arte Moderna de 1922-2018 do Ministério da Cultura e Prêmio UFES de Literatura 2019/20, da Universidade Federal do Espírito Santo.
Abaixo, Vanessa Maranha resenha o romance Lauren de Irka Barrios. Irka Barrios é contista e novelista, mestre em Escrita Criativa (PUCRS). Premiada no Concurso Brasil em Prosa (2015) com o conto O coelho branco. Atua na organização do coletivo Mulherio das Letras – RS. Tem contos publicados nos livros Língua Rara (Ediciones Outsider, 2017), Cem anos de amor, loucura e morte” (Editora Moinhos, 2017) e Não culpe o narrador (Editora Bestiário, 2018).
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Lauren, uma grata surpresa literária em 2019
Com destreza técnica e olhar afiado, Irka Barrios constrói thriller psicológico absolutamente atual.
Lauren, Editora Caos & Letras, é o primeiro romance de Irka Barrios, como trabalho de conclusão do mestrado em Escrita Criativa, da PUCRS, referendado pelo escritor Luiz Antonio de Assis Brasil, um dos grandes radares hoje da literatura contemporânea brasileira.
Inserido na classificação terror/suspense, Lauren pode também ser avaliado como um thriller psicológico que acompanha a personagem Lauren, uma pré-adolescente que se descobre bissexual e enfrenta bullying escolar também por estar acima do peso; elementos como uma figura materna autoritária que aos poucos vão dando causalidade à construção psicológica da personagem; um pastor abusador e as dificuldades de adaptação ao seu entorno, bem como a hipocrisia advinda da dupla moral religiosa dos ‘bosquenovenses’, uma espécie de Macondo arrevesada, permeada por folclore urbano, ‘fundada por casal adúltero’ (como se amaldiçoada) lendas de assassinato, bruxaria e satanismo, à espera de um demônio sempre premente. Tais inserções dão estofo dramático a essa bela construção literária.
A história se inicia de uma forma belamente atordoante e rápida e assim se desenvolve: várias sugestões vão sendo oferecidas em velamento aos poucos, feito um mosaico, construído pela percepção do leitor: a elipse é o um dos grandes trunfos técnicos da autora Irka Barrios, bem como o anticlímax.
Simultaneamente, com maestria narrativa que remete o leitor a uma linha borrada entre fantasia e realidade, fenômenos paranormais assombram a atmosfera e a personagem, tudo isso conduzido, por vezes, pelo recurso do fluxo da consciência, entrando e saindo da cabeça da personagem em jogos de duplicidade que vão envolvendo e intrigando o leitor paulatinamente ao ponto da narrativa tornar-se tão eletrizante que não se conseguirá abandonar o livro antes do seu desfecho.
Uma trama algo kafkiana, que apresenta e desfolha, para então desconstruir a hipocrisia e o grão de loucura e por que não (?) o horror que há em todo agrupamento humano. Não é pouca coisa para quem praticamente acaba de estrear na literatura romanesca.
Saudemos essa bela surpresa literária.