Cinco poemas de Danilo Giroldo
Danilo Giroldo. “Tenho 44 anos, sou professor e pesquisador na Universidade Federal do Rio Grande – FURG na área de Ciências Biológicas. Tive poesias publicadas pela Editora Vivara (Concurso Nacional Novos Poetas, 2018), pela Editora Trevo (Antologia Poesia Agora – Edição de Primavera, 2018) e pelas Revistas LiteralLivre e Literatura & Fechadura. Em 2019 publiquei meu primeiro livro de poesia pela Editora Patuá (Vala, 2019) e recebi duas premiações (3o Colocado no Prêmio Absurtos – Poesia Libertadora da Editora Absurtos e 2o Colocado na categoria Contos, modalidade regional, do Prêmio Mário Quintana – SINTRAJUFE/RS)”.
Instagram: @danilogiroldo
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Buraco
Não se pode sozinho cavar fundo demais,
procurando o que quer que seja.
Arrisca-se a ficar preso no buraco,
pois não se chega do outro lado do mundo,
mesmo que seja o mais perfeito buraco que já existiu.
O problema é perceber que já não se consegue sair.
Uma vez sozinho lá embaixo,
ou se para, olhando o céu,
ou se continua cavando,
mesmo sabendo que de lá nunca se sairá.
No final será só um buraco fundo,
com alguém velho e exausto dentro,
que não tem mais força pra sair,
nem pra cavar.
À espera de um resgate,
que pode nunca chegar.
A quem possa interessar:
se for cavar um buraco,
não esqueça de deixar uma corda,
presa na superfície,
para fugir ou se enforcar,
quando perceber que o buraco é só um buraco,
e não há nada a procurar.
(Vala, Patuá, 2019)
*
(R)Evoluções em espiral
Atônito observo as espirais
E, espiralmente, movimento-me,
perdendo a referência e a direção.
Busco conduzir a rota,
analisar a trajetória,
incapaz de saber o que restará
depois que os furacões passarem.
Em desespero, tentam frear a espiral,
nada sabem sobre relatividade,
travam aqui e ali, pensam ter sucesso,
mas não notam a espiral maior que os conduz,
nesta fractal caótica e imprevisível,
ainda longe de estabilizar.
Revoluções estão em curso
na introspecção de cada um.
Frente às telas hipnotizantes,
nasce uma nova humanidade.
Crítica e frágil, infante,
busca aprender sem conhecer,
termina perdida e dominada.
A sociedade líquida que evapora,
bases frágeis não sustentam
o peso da unitarização do pensamento,
massificado pela manipulação.
Há tempo para reforçar a estrutura,
ou a ruptura reordenará a sociedade.
Girando em espirais aceleradas,
sinto só vertigem e só, por enquanto.
(Vala, Patuá, 2019)
*
Aponia
Não importa se lateja
ou finca-te a pontada
Se arde, queima
gela ou te contorce
Não importa se é de dentro
localizada ou te percorre
Se é de fora, na pele
na unha ou nos teus olhos
Não importa se é nos nervos
ossos, carne ou no tendão
Se dói na alma, no âmago
ou no fundo da tua mente
É com ela que tu segues
É dela que tu foges
É para ela que o veneno
penitente tu ingeres
É na esperança do alívio
que em vão te moves
Mas sabes na verdade
que tua luta é perdida
Vencido cedo ou tarde prostrarás
Tua fraqueza agora reconheces
e o conforto que ao cabo buscas
apenas na derrota se fará
É talvez por isso
que a corda e a lâmina
te ofereçam cálidas
o sentido que procuras
Com as vozes que hoje escutas
se de fato notas o terror
neste ar covarde e atroz
sabes que só no descanso vencerás
*
Vida viva
Carne viva, vida morta
Os olhos olham
a pele repele
e a existência não existe
A morte é presente
toque ao alcance
a hesitação ao decidir
a confusão na mente
Sentir-se morto em vida
a vida viva se esvai
a cada passo desiludido
a cada dúvida que cresce
A racionalidade é precipício
A ignorância salvação
O profundo que sufoca
O raso que alivia
Quero apagar a consciência
viver só para existir
encontrar a beleza não em mim
no ar puro e no céu claro
No rato e no besouro
No verme e no falcão
Na planta e no gafanhoto
No fungo e no plasmódio
Carne morta, vida viva
Vida de verdade
Não na mente da mentira
A especialização que me condena
Ao fim cheguei
A ele me entrego
Do encéfalo me liberto
Para a vida me desfaço
*
Tu
Armo, armas, arma-te
Amo, amas, ama-nos
Por que me miras?
Não me ouves?
Não te ouves?
A quem escutas?
Sabes do que se trata
Não vês do que se trata?
Vê como me trata
Vê como trata a ti próprio
Trata de tratar-te logo
Figa, fuga, fugaz
Fuja e faz o que queres.
Faça, ou te farão não fazer
Farás o que não queres
Note, mote, morte
Book, boca, fala
A língua que se move
fraca, faca, feito nada
Muro, murro, morro
Mato sem cachorro
Cão sem dono
Donos de si
Não para sempre
Enfim o fim se faz