Cinco poemas de Fernanda Noal
Fernanda Noal é gaúcha, tem 26 anos e é mãe e aprendiz de uma menina cearense de 3. Escritora e poeta desde criança, fortemente influenciada por ser assídua leitora de tudo e qualquer tipo de literatura, com uma queda por terror, fantasia e poesia. Artesã e compositora (de linhas metafóricas e literais), arrisca alguns acordes no violão para cantar o que não cabe no papel. Tem dois contos (“Mike” e “Seis Viagens”) em duas coletâneas de contos publicadas pelo Projeto Passo Fundo, e alguns poemas em outras três coletâneas de poesias publicadas pelo mesmo Projeto, onde também é colaboradora como autora www.projetopassofundo.com.br
Tear
às vezes os dias são tão ferozes
embora serenos
pequenas rupturas no tempo
e nos espaços em que cabemos
somos tão frágeis
somos tão fortes
mantemos um estrutura inquebrável
adaptável
imprescindível
o amor é um fio que encontra a perfeição no macramê
que repousa esquecido no tear
eternamente inacabado
*
Quando começo a pensar
quando começo a pensar
mergulho em perigosos abismos
em medos profundos e abstratos
porém,
também,
quando começo a pensar
liberto-me do peso de existir
do vazio eco que carrego por estar
em um mundo que não me identifico
e sei
que se todos conseguíssemos pensar
como um todo
um mesmo organismo
uma mesma espécie
não seria cruel viver entre os homens
como me tem sido
e eu sei,
que é triste despertar do meu pensar:
cristalino córrego em que deságuam todas as minhas dores, frustrações, culpas
como um filtro em que me purifico
para este mundo:
de águas turvas e revoltas em que mergulho
sem saber
ao certo em que direção
me deixo carregar
como as folhas secas do outono alaranjado em que me perdi
como o inverno morno em que me encontrei
o vento molda ondas magníficas
em oceanos inabitados
porém,
também,
vez ou outra engole cidades
tenta recuperar seu precioso espaço
mas, ele não é mais o mesmo
e nem voltará a ser
exatamente
e seu ápice ainda está por vir
e será iluminado o despertar
de consciência
o amanhecer das mentes
quando todos os pensamentos
por um momento
forem Um.
Como o acaso que me deteve
Quis me conhecer e ceder
ao impulso de me aceitar
me gostar
como sou
Sem tingir meu sorriso ou conter meu riso desafinado
de timbre agressivo
Quis não criticar meu interior excêntrico,
explosivo,
corrosivo,
áspero,
por ora suave.
Quis aceitar o desgaste
emocional, habitual, ordinário e por ora pacato
De toda minha existência morna
Que já ferveu, já congelou
Já desabrochou em flor de beleza selvagem
Carnívora
De mil tons
Que por ora empalidecem todos ao sereno
Expostos como meu humor
indeciso e cítrico.
Quis me desconhecer
Afinal
Quis me perder de mim
Que aos acasos me mantive sujeita,
E agora me quis exatamente imperfeita
Como o acaso que me deteve.
*
Quisera
Secos devaneios me levam à tua lembrança áspera
Como areia esfoliando a pele
Como o vidro triturado em tuas narinas
A ti, que desnuda meu pensamento reservo esses versos
Tristes e empoeirados
com o tempo perderam a rima
Embora permaneçam em chamas ardendo dispersos na neblina
Eis minha alma inclinada à redemoinhos e tormentos
Eis meu ego dissipando qualquer lamento
Quisera ter permanecido à sombra desse sentimento tolo
Quisera ter perdido o foco desse fogo que queima invisível aqui dentro
Quisera não ter sido a lenha desse fogo
Mas fui
E ainda sou.
*
E o pulsar se confunde com tudo que não cabe no sentir
por quais brechas, fragmentos e espaços, eu estou desaparecendo?
aos poucos ou de repente
pelas beiradas em que abaixo meu olhar?
de tantas esquinas e dores sem repouso
tantas feridas em que nos esquecemos quem somos
quase até de respirar
e o pulsar se confunde com tudo que não cabe no sentir
nem no dizer
nem no existir
será que estou vazando lentamente pelos canos
pelos enganos
pelos ralos
em que nos escoamos
deixando ir também
muitas vezes
a nossa melhor parte?
elaine castro
Além de toda a descrição feita, ela é amiga, confidente, guerreira de sangue forte!
Sempre com palavras bonitas!
a saudade é tão grande Fernanda! Minha mandy. Amo-te!