Cinco poemas de Ingrid Bonfim
Ingrid Bonfim é graduada e Mestra em Letras (UFPI). Professora de Linguística e de Leitura e Produção Textual (UECE/FECLI). Coordena projetos direcionados à leitura, escrita e suas práticas sociais. Se aventura escrevendo poesia e, aos poucos, está saindo do armário da escrita e publicando seus textos.
***
Baile
abracei meu corpo
perfeito-imperfeito
e o chamei para dançar.
*
Semente (ou devaneio fictício com Tom Zé)
a ideia é uma semente,
uma possibilidade de germinação
em local insólito
que momentaneamente brota
bruta, embrionária, paupérrima,
sedenta de complexidades
e de cuidados
tal qual a flor que nasce no concreto;
cria raízes e se espalha
em proporções irrefreáveis
quebrando os muros que a aprisionaram.
o insólito, então,
se transforma
em fecundo,
em resistência,
em arma.
quem ousa barrar a força de uma ideia?
*
Queda livre
não tenho medo de me jogar do precipício,
de ter meus sentimentos em queda livre.
de colidir. estilhaçar. sucumbir.
não tenho medo de algum dia – a quem pertence o futuro? –
a chama apagar.
não antecipo. espero. vivo.
não tenho medo dos meus devaneios,
minhas quimeras e meus terrores.
posso atirá-los ao abismo junto com meu corpo e meu espírito.
então, imersa em meus pensamentos, divago.
me faço. refaço. renasço.
e sigo – com vísceras, feridas e cicatrizes em carne viva –
em busca de novos abismos,
novos precipícios.
não tenho medo de que o abismo olhe de volta para mim.
*
pulsão de morte onírica
mar ao fundo
de mim
mar adentro
azul
calmo e sereno
jogo-me no mar
ao fundo
no mar
afundo…
a morte é o fim do medo
de não ter medo
da existência
*
Elegia (ou fome por mais)
Pele macia,
colorida.
Lábios, cheiro, seio, saliva.
Lânguida face,
cangote
Mãos laços amassos.
Corpo nu, cru.
A língua exagerada,
insaciável
percorre as ondas de tuas curvas
malemolentes e libidinosas.
Os olhos de ressaca tragam, arrastam.
O desejo
multiplica, soma, divide.
Suspiros sussurros gemidos
na cama, no chão, contra a parede.
As mãos apertam, sentem.
A palavra seduz, provoca;
a carne dura treme, rebola.
Os corpos entrelaçados de suor
pulam dançam cavalgam encaixam.
Os dedos errantes penetram
em cima, embaixo, entre.
A flor desabrocha
respira e transpira tesão;
abre-se para o mundo admirar sua beleza.
Num morde fode
o gozo escorre pelo ventre;
a maré inunda,
lambuza o corpo e a alma.
Sem molduras, sem armários;
apenas a serena humanidade.
O que resta,
o que somos é
sexo poesia amor revolução
e fome por mais.