Cinco poemas de Tomás Sottomayor
Tomás Maria Sottomayor da Silva Alves Pimenta nasceu a 4 de janeiro de 1994 no Porto. Com quatro anos foi matriculado no Oporto British School, colégio que frequentou até ao sétimo ano. Prossegui os estudos na Escola Secundária Clara de Resende tendo acabado o secundário no Colégio Cebes. Atualmente tem a licenciatura de Línguas Modernas na variante estudos anglo-americanos por concluir.
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Trovador
Do homem que coleciona nuvens sei apenas que tem o veneno no seio e o vício
no regaço
Que se afoga nos espelhos e que os estilhaça quando se rasga rubro sempre de culpa
de ser seu
E de assim querer ser.
Um dia na orla – palavra que era como um animal de estimação, que orlava o seu quarto
de sombra e relva de jogo – avistou um pássaro como uma esfera pulsante
de canto
E lembrou-se de murmurar:
Círculo de fogo, sim! Canta também, assoma às copas das grandes árvores! …
A migração depois silenciou a terra
Mas o homem colecionara as nuvens
Como pinhas, insectos, selos ou flores.
O tempo prosseguiu
E ele plácido do silêncio amigo
Como que a bebericar mel da neve que amortalhava o mundo
Chorou a lápide da terra que o comovia.
Com um sorriso interior
Chorou o destino que todos partilham
Sem nunca nele realmente crerem.
*
Procurei a sílaba nos teus flancos
Na água que escorre nas janelas.
Terei a firmeza suficiente
Para tragar verdadeiramente o ar
Sair desta campânula
Onde vagamente hábito as incisões?
Onde está a ogiva do bosque
O frontão e os frisos do promontório?
Procuro o verso fundo e cheio de musgo que firmou a alvorada
E o terno instante dum luminoso olhar.
*
Peixes
Porque os pássaros sãos irmãos dos peixes
E das águas navegadas o sonho do espaço brotou
Nas constelações reluzentes e líquidas
Das heras escuras do tempo.
Mas o homem parece no casulo ainda
A seiva coalhada esmorece
E está perdido a escorrer no espaço-tempo
Na braçada sobre o fecundo oceano que morre.
Revolta o lar dos que o ensinaram a navegar
Os que ensinaram os pássaros a voar.
Brilhantes os dorsos das baleias
Os dorsos dos barcos: Árvores sonhadoras
Mas tudo o mar consome
Quando a história é um sonho em que o homem não crê
E sonolento sobe aos cumes dos astros
Mergulha nos abismos subaquáticos
À espera da mão terna do sono
Com o conforto da sua história.
*
S.
O alvor da pele lisa
As pupilas abertas e fundas
como um poço até ao
sol d’infância.
É de ti que brotam
as flores que em
mim vicejam.
E moves-te ainda
Docilmente
Como um funambulista
pela corda esguia
da vida.
*
O levante já a rosar os contornos das nuvens
As pestanas e o fumo azulado do haxixe…
Há um zumbir, um rumor interior
Do corpo langoroso:
Um silêncio plácido
Como o murmuro do oceano que a concha recolhe
O estremecer da terra que não sentimos
Neste esvair da nossa migalha de tempo.
E é verdade o que dizes
De como nos agarramos à vida aterrorizados.
E aquela verdade é hostil
Aquela verdade não faz ninguém sorrir…
Sentir um oceano a vazar dentro de nós
Contrariamente à harmonia que é o movimento gracioso
À luz do sol
É o veneno no seio
O vício no regaço
Do homem que coleciona nuvens.