Cinco poemas de Yamil Escaffi
Yamil Escaffi é um poeta e artista experimental boliviano, com produções artísticas em poesia visual e instalação de arte. Entre suas publicações de poesia, destacam-se Jaula Elemental (Yerba Mala Cartonera (YMC), 2010), Cadáveres Personales (YMC, 2014), Vigilar el Humo (MTB, 2014) e Terrae Motus em 2015 pela Editora Chilena Fonola Cartonera. Além das reedições de Editorial Mefistofelia: Humo Vigilado (2018) e Terrae Motus (2019), sendo este último reconhecido com a Menção Honrosa por melhor obra publicada de poesia, no âmbito do Prêmio Plurinacional Eduardo Abaroa.
Traductor: Adilson Guimarães Jardim
Editorial: Nordeste Cartonero Página: www.fb.com/nordestecartonero
Ano da publicação: 2019
Livro: Tornou-se um Pássaro
***
Tornou-se um pássaro (seleção de poemas)
Desengajamento
Estando onde antes me via
julgar ser alguém mais que morre em mim.
Parasito meu corpo.
Sem forma. Sem com que mudar. Sem desde onde.
Sólido lugar de fechaduras.
Uma jaula sem a filtração da noite.
E, dentro, em minha casa de chaves
morro na forca quando pilhas de palabras
se derrubam sob meus pés.
Não sei como sucedem os pássaros
sem imaginar que alguém os desenha em uma luz
que cose na placenta de minha voz.
E não sei da jaula mais que um poema imortal.
Uma casa maior que minha garganta.
Um lugar para guardar quase todo meu corpo.
/
Desanidación
Estando donde antes me miraba
jugar a ser alguien más que muere en mí.
Parasito mi cuerpo.
Sin forma. Sin con que mutar. Sin desde donde.
Sólito lugar de cerraduras.
Una jaula sin filtración de noche.
Y dentro, en mi casa de llaves
muero en la horca cuando apilaciones de palabras
se derrumban bajo mis pies.
No sé como suceden los pájaros
sino imaginar que alguien los dibuja en una luz
que cose en la placenta de mi voz.
Y no sé de la jaula más que un poema inmortal.
Una casa más grande que mi garganta.
Un lugar para guardar casi todo mi cuerpo.
*
Surdo
Palavras que decidem entre fumo e incenso
Talhos nos lençóis e cinzas de pássaros
Cores abrem suas pálpebras de água
Alcatrões que brincam de filtrar até o cérebro
Enquanto o vento persegue aranhas que não existem
/
Sordo
Palabras que deciden entre el humo y el incienso
Tajos en las sabanas y ceniza de pájaro
Los colores abren sus párpados de agua
Alquitranes que juegan a filtrarse hasta el cerebro
Mientras el viento persigue arañas que no existen
*
A cal
A terra se abriu e eu saí, tinha nas costas um poema escrito.
Demorei anos para descerrar minhas pálpebras mas sempre recordarei o que ouvi.
Quando não fechavam minhas feridas, o odor trouxe tubarões aos meus sonhos.
Consolei meu corpo com unguentos ilegais e caminhei sempre cercado de espinhos, escondido do resto para quem morro como espuma nos caldos dos instantes que passam.
Cheira a pão cada vez que acordo quebrado e nunca saberei,
a terra me convocou desde dentro,
agora, sem espaço em meu corpo para seguir escrevendo poemas.
/
La cal
La tierra se abrió y salí, tenía escrito un poema en la espalda.
Tardé años en despegar los parpados pero siempre recordaré lo que oí.
Cuando no cerraban mis heridas, el olor trajo tiburones a mis sueños.
Consolé mi cuerpo con savias ilegales y caminé siempre rodeado de espinas, a ocultas del resto para quien muero como espuma en los caldos de los instantes que pasan.
Huele a pan cada que me despierto roto y nunca lo sabré, la tierra me ha convocado hacia adentro,
ahora, sin espacio en mi cuerpo para seguir escribiendo poemas.
*
Movimento involuntário
Bosque jaula gigante de salgueiros que fazem rede com seus troncos.
Caminho aberto com machete. Montanha no meio da planície.
Cascatas e rochas de papel. O mar de margens com sede, que deixam com nada.
Teu naufrágio nunca será completado. A verdade não tem forma de chave.
Teu albergue são os abutres, rodeando-te.
Havia uma canção, porém feita de palavras. Nem longas nem breves duram as sílabas em tua memória.
Havia um caminho e não o viste. Há apenas rabiscos nas paredes do tempo,
feitos pelo mesmo garoto que desenha tuas recordações.
De quantas peles te despes até restar apenas a de dentro?
Pudesse eu saber teus medos pela espessura de tua alma.
Sim, um clandestino de um barco tomado pelos peixes,
com olhos de um corpo queimado por seu coração sem fogo.
/
Movimiento involuntario
Bosque jaula gigante de sauces que hacen red con sus troncos.
Camino abierto a machete. Montaña a mitad de la planada.
Cascadas y rocas de papel. O mar de orillas con sed, que dejan con nada.
Tu naufrágio nunca será completado. La verdad no tiene forma de llave.
Tu albergue son los buitres, rodeándote.
Había una canción pero hecha de palabras. Ni largo o corto duran dos silabas en tu memoria.
Había un camino y no lo viste. Solo hay garabatos en las paredes del tiempo,
hechos por el mismo niño que dibuja sobre tus recuerdos.
¿De cuantas pieles te despojas hasta quedar solo el de adentro?
Pudiera saber tus miedos por el grosor de tu alma.
Aja, un polizón de un barco tomado por los peces,
con ojos de un cuerpo quemado por su corazón sin fuego.
*
Silencio com o que há
Falo de dentro
até que minha voz entenda
que as palavras chegam
em jaulas que flutuam.
Não haverá pele para onde vamos,
mas levaremos feridas.
Falo
do que não tem lugar,
de onde viemos.
O recôndito que tem forma
de um nome perfeito.
É que a jarra da sede está invertida.
Em todas as minhas visões há cristais.
Falo imune do tempo,
despertando ao tato.
Sem pulmões para asilar nenhum ar.
Sem liames para adormecer a terra que me sequestra.
É que não alcanço minha voz,
enquanto vejo do chão,
desde a resina de meus olhos.
/
Silencio con lo que hay
Hablo desde dentro
hasta que mi voz entienda
que las palabras llegan
en jaulas que flotan.
No habrá piel donde vamos
pero llevaremos heridas.
Hablo de lo que no tiene lugar,
de dónde venimos.
El recoveco que tiene forma
de un nombre perfecto.
Es que vaso de la sed está invertido.
En todas mis visiones hay cristales.
Hablo inmune de tiempo,
despertando al tacto.
Sin pulmones para asilar ningún aire.
Sin cales para adormecer la tierra que me secuestra.
Es que no logro mi voz,
mientras veo desde el suelo,
desde la resina de mis ojos.