Do colunista para você – Por Hugo Lorenzetti Neto
Na coluna mensal “Jerônima” (clique aqui para acessar todos os textos da coluna), a bonita Hugo Lorenzetti Neto nos traz – no melhor estilo eu-miss-desejo-a-paz-mundial – traduções de autoras e autores de diversas línguas e partes do globo. Diplomacia com plissado rosê. Regras: 1) cada coluna é um baile temática, os textos traduzidos têm um tema em comum; 2) uma espécie de ensaio inédito do colunista amarra sempre as traduções. A coluna irá ao ar sempre na última quinta-feira do mês.
Hugo Lorenzetti Neto é diplomata e tradutor, e atuou quase toda sua carreira, de 2006 até o momento, na área cultural do Itamaraty. Atualmente lotado no escritório do Ministério em Recife, oferece oficinas de escrita e realiza clubes de leitura, além de divulgar poesia em seu projeto O Caderno Rosa (@ocadernorosa, no Instagram).
***
Do colunista para você
para Ismar Tirelli Neto
Um amigo recentemente resistiu, e não voltou a beber. Outra amiga concordou em se juntar comigo e outros para escrever, depois de professar sua crença de que a gente tem que continuar querendo para fora da distopia. Outro, não exatamente amigo, mas antigo colega, tirou sua vida com uma facada no peito: e eu penso, aterrado, na violência da dor nesse coração, que fazia a lâmina e a agonia parecerem menos sofridas. Grandes amores de sempre me dizem que estão perdidos – de si mesmos, não serei ambíguo. Meu grupo de estudo se encontra mesmo num feriado, cada um com uma e quase a mesma tristeza: mas se encontra.
Eu mesmo, mês passado, não escrevi a Jerônima, por afogado em obrigações e tristuras.
Essa dor passa, mas não passa. Não há muito consolo. A tristeza é um ansiolítico, no entanto, uma vez meu analista me disse. E essa pequena introdução ao poema que escolhi para abril não quer motivar ninguém a nada. Aliás, dentro de certos contextos, é melhor agir menos, veja o que tanta ação irracional trouxe.
Mas quietinho a gente deseja. Foi o que minha amiga disse. A gente deseja o futuro, a gente pode caladinho querer muito que as coisas sejam: contas pagas e uma sobrinha de dinheiro; chocolate do bom e um bom queijo fedido; namorar o menino bonito da aula online e que não faz ideia que tô olhando; conhecer um país longe e outro perto; fazer novos amigos que eu possa abraçar e abraçar os velhos – e meus velhos; e tudo. Absolutamente tudo o que não maltrata ninguém e é bonito.
Mas pra isso a gente tem que continuar vivo. Diz pra essa gente, por favor, Langston Hughes.
Mother to son
Langston Hughes
Well, son, I’ll tell you:
Life for me ain’t been no crystal stair.
It’s had tacks in it,
And splinters,
And boards torn up,
And places with no carpet on the floor—
Bare.
But all the time
I’se been a-climbin’ on,
And reachin’ landin’s,
And turnin’ corners,
And sometimes goin’ in the dark
Where there ain’t been no light.
So boy, don’t you turn back.
Don’t you set down on the steps
’Cause you finds it’s kinder hard.
Don’t you fall now—
For I’se still goin’, honey,
I’se still climbin’,
And life for me ain’t been no crystal stair.
*
De mãe para filho
Langston Hughes
Olha, filho, vou te contar:
A vida pra mim não é nenhuma escada de cristal.
Ela tem tachinhas
E farpas
E pisos revirados
E lugares sem nenhum carpete no chão –
Dureza.
Mas esse tempo todo
Eu vou subindo,
E chegando a patamares,
E virando esquinas,
E às vezes entrando no escuro
Onde nunca teve luz.
Então, menino, não desista
Não se sente nos degraus
Porque você acha que tá meio difícil
Não cai agora –
Porque eu continuo indo, meu amor,
Continuo subindo,
E a vida pra mim não é nenhuma escada de cristal.