Manifesto Periférico – Jeidma Marinho de Almeida
Jeidma Marinho de Almeida é mãe do Tales, professora de História, educadora perinatal, doula e aprendiz de poeta. Nascida em Taguatinga Tocantins e criada em Samambaia. Militante feminista- não burguesa, de Esquerda, LGBT, ateia não praticante, devota de todos os santos e orixás, filha de Nossa Senhora DAbadia e Oyá.
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DEUSA KALI
É do ouro de Oxum
que é forjada sua essência,
Uma paixão contraditória:
sua Magia e minha Ciência.
A Água doce tem sabor
da nascente do seu beijo,
Que escorre em minhas pernas
a cachoeira do desejo.
E ainda que eu negue
a existência do Sagrado,
Eu venero sua crença
e o seu Fogo Encantado.
Dividindo o mesmo amor
sem saber do amanhã,
Se entregue à ventania
pois sou filha de Iansã.
És Cigana ou Pomba Gira,
És rainha Ijexá,
Yalodê do meu Terreiro
Maria Padilha, Egunitá.
*
Bença, Vó!
Queria poder estar
embaixo de um Pé de Ingá,
Rapando um tacho de amor,
cheinho de pêtas de flor.
Queria pular o riacho
pra te ver aguar o canteiro,
Descer a ladeira do Alto
E sentir de novo o seu cheiro.
Queria ir para a dispensa
procurar um quebrador,
Que quebrasse essa saudade,
E adoçasse minha dor.
Queria voltar ao tempo,
bendizer a minha crença
Passar em sua calçada,
parar e pedir a bença.
Mas o tempo não tem pressa,
e me resta só ter fé
Que saudade forte é essa?
– Valei-me meu São José!
Grande será a demora
e a garganta dá um nó,
E enquanto não chegar hora,
vou pedir a Nossa Senhora:
– Cuide bem da minha avó!
*
Sobre História
Passeei pelo seu corpo em cada palavra proferida sobre o mundo.
Dentro das tuas trincheiras, minha língua percorreu todas as eras:
das Revoluções e dos Extremos.
Desejei sua Geografia enquanto fantasiava minha História.
Arrepios invadiram minha pele em uma Guerra Fria
(olhares quentes).
Deliciamo-nos com gostosas teorias,
orais eloquentes.
Minha ciência penetrou sua fé,
e eu me despi da verdade absoluta.
No final, depois de tantos orgasmos,
materialistas, históricos e até dialéticos,
nunca nos tocamos, apenas nos lemos…
*
Eu rio
Em águas calmas ou turbulentas,
eu rio…
Rio que corre solto,
no som da correnteza das gargalhadas.
Ainda que a terra caia sob meus pés molhados,
eu rio!
Rio de nervoso redemoinho,
que engole a alegria vívida.
Mesmo que não saiba qual afluente seguir,
em desespero da fuga do que é real,
eu rio!
Rio em prepotente margem,
marginalmente arenosa, teimosa, esvaída …
Ainda que minhas lágrimas craquelem o terreno da minha alma
em seca sertaneja,
Eu rio!
Pois é na força do meu riso
que desaguo em São Francisco,
bebo um gole de sede,
e me engasgo com o mar…
*
Parto do Princípio
Tenho pra mim que Deus é mulher,
e que a força que contrai o útero
é a mesma que move o mundo.
Parto do Princípio
Vulva à Vida
Óvulo fecundo.
Tenho pra mim que Deus é mulher,
e que a força que contrai o útero
é a mesma que move o mundo.
Ave Maria, força girandeira
Vagina aberta
Terra que semeia.
Tenho pra mim que Deus é mulher,
e que a força que contrai o útero
é a mesma que move o mundo.
Vadia, puritana
Big-bang invertido
Explosão clitoriana.
Tenho pra mim que Deus é mulher,
e que a força que contrai o útero
é a mesma que move o mundo.
Menstruação enclausurada
Sabedoria difamada.
Divindade estuprada.
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Elias Borges de Campos
Bença, Jeidma Marinho, ateia não praticante…Ave, poesia!!!
Cynthia Madalena de Jesus e Silva
Que lindeza de versos. Saborear essas palavras preeche um pouco o vazio de palavras que tenta revelar o que sentimos.
Parabéns!!!!!💚