Poema para domingo – Ângela Coradini
Ângela Coradini é poeta, roteirista e pesquisadora. Com doutorado em Cultura Contemporânea é autora dos livros “Imagens-espectro de futuridades no Amplo Presente” (EdUFMT), e dos livros de poesia “Já não podem ser amanhã…” e “Quatro Nós” (Carlini e Caniato).
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poema para domingo
Poema 30. do livro “…Já não podem ser amanhã”
“anoiteceu?”
ou só uma nuvem atenuou o sol?”
divago, enquanto a luz,
tão tímida, vaza
nos entremeios da janela
quente
o seu sono vai pesando
em mim
percebo ser tarde da tarde
mas não me movo
deixo a sua respiração, funda e lenta,
rasgar a minha pele
vez
após
vez
e pelo embalo do seu hálito
deslizo
entre sono e vigília
você se move
encaixa, ainda mais, meu pequeno corpo
no seu
e na rouquidão do descuido,
o murmúrio:
– que horas são?
e em te olhar eu me lamento
“não queria ter de ir”
mas até com as pernas, você me molda
minha alma grudou na sua
preciso encontrar ar para cochichar:
– preciso ir…
mas você me afronta:
– e para onde você vai?
despenco sem me soltar de você…
“não sei”, quero dizer
“nem sei porque eu disse isso”, quero acreditar
entardece mais uma hora,
e sob o seu calor ainda me deixo
você reclama:
– pés gelados. sente frio?
eu me entrego
– meu coração deve bater devagar.
mas você me contradiz:
– não, é porque ele bate mais depressa…
(na pausa,
entre uma palavra sua e outra,
te olho querendo concordar
“o meu coração é mesmo
de-ses-pe-ra-do!”)
e você conclui:
– …. mas não funciona com força suficiente. escuta o meu.
me derrubo no seu peito
querendo dizer
que já te escutava, há horas,
dizer que escutava
a sua calma
batendo
o seu peito tão preciso
tão certo
batendo
tão seguro
batendo
nos meus ouvidos
nas palmas das minhas mãos
batendo
até dentro de mim
dando nó atrás de nó
“por que diabos eu te ouvi por dentro?”
batendo
nó
atrás
de nó
cada batida sua
me bagunçando
me acelerando
me fazendo funcionar
cada vez
mais quente
entregue
e mais