Quatro poemas de Ana Elisa Ribeiro
Ana Elisa Ribeiro é mineira de Belo Horizonte (1975), autora de livros de crônica, conto e poesia, além de infantojuvenis. Entre os livros de poemas estão Anzol de pescar infernos (SP, Patuá, 2013), Xadrez (BH, Scriptum, 2015), Álbum (BH, Relicário, 2018) e Dicionário de Imprecisões (BH, Impressões de Minas, 2019). Tem textos traduzidos para o espanhol, o francês e o inglês e participou de eventos literários no Brasil, em Cuba, na França e na Colômbia. É doutora em estudos linguísticos pela UFMG.
O poema “O príncipe e a megera” foi publicado no livro Xadrez. Os demais são inéditos.
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Vinco
me abate e desfigura
um desânimo aterrador
a célere visão
como se o chão
me pudesse engolir
e se me debato
viro-me ao avesso;
em meio a tanta
carne & sentimento
vejo mais um vinco nascer
& penso:
nada que o tempo
não possa esmaecer
*
El niño
a poesia
tem se escondido
atrás das coisas
& tenho
me esforçado pouco
para encontrá-la
talvez a encontre,
já morta
se ressequida
já será vantagem
– poesia
também sofre
na estiagem
*
O príncipe e a megera
Um príncipe
com casa, carro, filho & pensão
relógio de pulso
perfume importado
quarentão
bem-arranjado
até grisalho
fosse eu
e tudo isso
seria
defeito
*
Oração do olvido
oxalá eu esqueça
os poemas que lavrei
em arquivos e em livros;
os poemas que inscrevi
em concursos perdidos;
os poemas que se arrependeram
em linhas inconclusas;
e todos esses que
apaguei das telas de computador;
e os que anotei em blocos
e jamais foram transcritos
em páginas aflitivas;
oxalá eu esqueça
os poemas que escrevi;
e que os que escreverei
não me venham;
e que os poemas
que quase foram escritos
sejam leais a sua
admirável quasidade.
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(Fotografia de Adamo Alighieri)
Araceli Sobreira
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