Quatro poemas de Andréia Lara Kmita
Andréia Lara Kmita nasceu em 1977 na cidade de Campo Mourão – Paraná. É mestre em Literatura e Crítica Literária pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) com o trabalho O rigor e a sensibilidade poética da prática tradutória de Ana Cristina Cesar. Roteirista de cinema, graduada em Letras, palestrante e docente efetiva na SEDUC/MT, tornou-se especialista em Linguística Aplicada – Literatura brasileira (2009) e em Psicologia e Coach (2021).
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LEVE-ME
Aqui, deitada nesse vazio
percebo sua ausência maniqueísta
no ar, nada direciona estas vistas sofistas,
nem tão pouco o fluxo do pensamento,
nada se move… nothing more.
nem paredes, quadros, vasos, lugares… nem você.
Sua escassez coabita nos centímetros do presente,
nas quinas do teto onde desfaleço os dias a desejar-te
estática, inerte, se me movo me perco no mortório jacente
e perco você. Sinto no âmago terrível abscesso,
talvez seja amor… A dor não me causa náuseas do tempo.
Vago, vago, vago, metros quadrados sem precisar das horas,
embriagada pelo torpor dos olhos, tudo, tudo… Tudo é tocavelmente
seu, o som da minha respiração, noites e dias, infinitamente
seu… O som querendo entrar, o vento batendo nas janelas,
a paralisia dos órgãos, a minha essência morbidamente evidente.
Sinto sua falta em todos os momentos lúcidos e deturpados,
nos refrões das melancolias mais tenebrosas, Chopin nocturne
é meu vizinho mais próximo, lado a lado com meus afetos.
Toca…. toca e me toca mais uma vez, estou morrendo aos poucos,
noite após noite, no negrume cúbico do espaço ainda sinto você.
É na loucura insana que nos encontramos
em corpo e alma frente aos delitos e gritos rabiscados
em meus versos. Regresso, regresso, outrora amante,
mas não há mão que me ampare nisso
senão a sua, leve-me contigo
em breve senão nesse instante!
Estou entrando em ataraxia profunda,
absoluta quietude da alma, abatida, sem pedaços,
sem o afago dos beijos e seus abraços,
hiberno jaz no agora.
*
FEMININA COM “F”
O que posso fazer por você?
Que não careça desatino,
Que não seja destino,
Mas tenha agridoce.
O que?… Diga-me sem medo
Se o desejo lhe acometer cedo,
Porém…. Não…. Não diga nada
Saberei calada
O que lhe remete sorte
E oportuniza devaneios na mente.
Tão fácil perceber, aqui parada,
A sua expressão ser dominada
Quando cruzar minhas pernas
Quando ao abrir das janelas
A luz sombrear as nuas curvas
E seus olhos sorrirem
Sem eles perceberem.
É possível que você consiga
Não me olhar feito canibal,
Isso não seria mal.
Teríamos na paz simbólica
A fuga da emoção bucólica.
Eu poderia respirar
Sem ter que amar
Eu conseguiria caminhar
Sem a devoração do altar.
Eu gostaria…
De andar na rua
Sem sugerir
algo
Que não sugeri.
Feche os olhos agora
E só me namora,
Perfile-me com a boca aberta
Toda descoberta
E perceba que minha sombra
É da lua manobra
Para te cegar a ciência
Da própria existência.
*
BEIJO
Nós, indivíduos reconhecidos pela voluptuosidade
dos termos na demonstração do afeto paradisíaco, passageiros
nos vagões deleitosos das almas que habitam desejos criptografados,
daqueles que exigem código morse de liberação, ‘amizade’
periculosidade extrema
beijo afogado na orelha
engolidos beiços na submersa rigidez fosfórica
combustão espontânea eufórica
retórica da propina tênue do amor, e a caminho, somente a devoração
das almas que se emaranham no chão
compulsão do ar que lhe falta na paixão atraente, vertente
aniquiladora dos tempos, beija um, dois, triplo de vez
aqui, ali, cá com lá da Augusta, perdi-me de assalto
nos rolês de asfalto entre um e dois e três, tudo de uma vez
loucura dicotômica da ruptura de paradigmas e doutrinas escabrosas.
Beijo que se confunde em língua lânguida lambida da emoção
o corpo em libertação,
denominação das mãos frenéticas, hiperativas vadias,
classificações estúpidas da designação do ser
eu sou, tu és, ele é
o “cú de Adão”
só pode!
Podridão que não se aceita nesse mundo
universo avesso ao compasso do verso embriagado,
selvagem à revelia da degradação,
é coração…
Nivelados ao Darwinismo
levados pela intenção dos feromônios gritantes
na pele, tesões espalhados nos livros antigos,
canibalismos mitológicos
“Carne da minha perna”
vaidades amostra, sem receio do medo,
temperos soltos, loucos, sedentos por mais um beijo
mais um, dois, três, tudo de uma vez
eclode o termômetro da relação nas preliminares úmidas
sentidos em colapso que se embebedam nas volúpias
dos apertos e amassos no excesso certo
papo reto
a marca que te marca eternamente
luxúria da mente
qualitativo do prazer sinestésico
em um, dois, três…
pernas entreabertas
e o beijo
se lambuza.
*
BLISS
It is one of these expressions
Extremely confused
Nuclear eruption
Long period
Uninterrupted
Unintelligible
Unthinkable
Wild…
Two messy moves
From the soul.
Housing of the opposite
Calm and chaos
Peace and war,
Never far
Reason for intimate delirium
Absolutely necessary,
Unifying.
It is the strength of the cry
Intoxicating coma
An open letter
People
Stuff
Accelerated Thoughts
Skin contact
Life!
It is the exorbitant combination
Heat and cold
Vibrant voice
Anchor
I sink into this ocean
Unhurried
I die in joy
Libido
Deep.
Andréia lara kmita
Nesse tempo, onde o sol habita mar e mar habita a lua, sabemos, dantes das primaveras, que a poesia inundaria os campos secos.