Quatro poemas de Ariadne Marinho
Ariadne Marinho é graduada e mestre em História. Dedica sua vida ao deus Dionísio e ao leve Tom. Atualmente é uma atenta observadora do cotidiano.
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Espelhos por todos os lados,
olhos atentos aos seus próprios corpos,
reflexos de ideias narcisistas.
O outro sempre tem o corpo desejado,
muitas vezes ou quase sempre do mesmo sexo.
A deformidade,
a saliência,
a flacidez,
a gordura,
a magreza.
O ódio de si e a repulsa ao corpo
invocados cotidianamente.
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Duas da tarde, 40º C,
duas crianças ao sol.
Uma de 14 ou 15 anos leva nos braços seus filhos de dias
para vacinar, vacina que não tem.
*
Mercado vazio,
domingo de manhã.
Trago na derme a transgressão,
trago nos braços a prole.
Vejo, em olhos alheios,
o julgar e a ignorância.
*
Em tempos de crise,
em clima de golpe,
a intervenção é eminente.
Para muitos ovacionada,
para outros arrepiante,
beira o desespero,
o medo.
Meu corpo se estremece,
meu corpo preto,
meu corpo pobre,
meu corpo de mulher,
meu corpo bis,
homo,
trans,
meu corpo tatuado,
meu corpo que marca minha rebeldia,
marca também a repressão.
Meu corpo assassinado
Minha morte sem valor.