Quatro Poemas de Elieni Caputo
Elieni Caputo nasceu em Tanabi-SP e reside na capital paulista. Graduada em Psicologia e Letras, mestre em Literatura e Crítica Literária pela PUC-SP. Publicou três livros de poemas: Violência e brevidade (Penalux, 2020), Casa de barro (Patuá, 2018) e Poema em pó (7Letras, 2006).
Foi premiada em concursos literários nacionais e portugueses.
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MORTE CONTEMPORÂNEA
quando se perde
o último vestígio da alma
na chamada imagem
destrinchada com bisturis
pra conformá-la a um olhar
que logo se perde
e se reduz à cegueira
restam os retalhos
do corpo dilacerado
e tão conforme todos os outros
que a forma se conforma
com a exatidão da uniformidade
e a indistinção da exclusão em massa
o tempo é inexorável com a velhice
mas implacável com a repetição
corpos idênticos
não se inscrevem na memória
o que não tem nome sequer é de estimação
não é lembrado
e caminha para o descarte
e continua a todo vapor
a linha de montagem de novos corpos
com o mesmo destino
o desaparecimento contumaz
pelo qual ninguém vela
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VAGA-LUME NA CLARIDADE
Ainda criança, via o vaga-lume na claridade
achava que era uma barata
O vaga-lume centelha de estrela
virava barata na claridade
se apagava
Só tinha beleza no escuro
como estrelas distantes
cuja proximidade mata
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SOBRE O CIGARRO E O ESQUECIMENTO
Quando fumava, evocava memórias antigas: algumas feitas de ferro, pressionavam a parte fina do coração. Memórias em brasa, desejava extirpá-las a cada tragada, mas parecia injetá-las.
E quando fumava, a cada baforada, percebia que não esquecia a tristeza. E quando apagava o cigarro, o esquecimento não tomava a forma da fumaça.
E não se apagava.
Assim se despedia do que nem sabia, à mercê do rio da vida, que deságua no esquecimento e num dia que não me lembro.
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pague à vista
pague a vista
apague a vista
apague
vista
pague
apague
siga à risca
siga a risca
arisca
arrisca
risca