Quatro poemas de Lucas Lemos
Lucas Lemos é social mídia e fotógrafo de profissão. Ator e dramaturgo pelo Cena Livre de Teatro e aluno do terceiro ano de Letras-Literatura na UFMT.
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O som da cidade nunca é silêncio.
Antena girando sinais
Pássaro pousado na haste
Tem o viaduto que venta dentro dos cantos dos carros
E o arranha-céu que sente em suas curvas uma leve pontada de fim de dia
Muitas coisas o sentido sente
Já outras, só assiste ao tiro que dá o cara da garupa do motoqueiro que passa
agora pelo amontoado de concreto na rua de cima
Qual o diâmetro dos sonhos que percorrem os Desejos da metrópole? Qual é?
Ele está aqui no mirante do prédio,
sentado ao lado, dizendo que o futuro será lindo
Esse mesmo
distante e tão próximo,
Na cidade que tem um som que nunca é silêncio
É um Amanhã Inexorável
*
Lateral amarela
E lá estava eu
De novo, cíclico
Na lateral da casa
De muro amarelo
Tinta dourada
Fazendo história na memória
Infância em contraste
Tom contrário
Encontro do Agora
Este tom
Esses amigos contempladores de uma
Liberdade diferente
Da liberdade dos amigos imaginários daquela época.
Eu, quase sempre quis compartilhar
nada,
porque achava que um nada era melhor que qualquer coisa.
E de repente a imagem da foto me salta às vistas
Renato está lá
Bruno
Matheus
Gabriele
E há tantos outros
Tanto e tantos
Sobra falta
O muro amarelo da casa
Seu olhar louro me perguntava
“Cadê a sua postura de anjo primoroso? Não anjo caído. Gouche miserável!”
Mas, o muro também é cinza
Fresta de Vênus
Som no ambiente da reunião lá dentro da casa
“Oooh sunday morning”
Profunda recordação
Plasmática
Gelatinosa
Agridoce
A canção recordista me invade
Ah, a época em que tudo era amarelo…
Se encontra com um outro eu.
De novo, cíclico
Estático e se encarando
Encontrado em seu perdido
Na lateral da casa
De muro amarelo
*
Peso morto
Chorei enquanto vi mais uma
Trans travesti traveco
Mulher desviada
assassinada.
Chorei quando o peito enodulou
Pedindo socorro
Pelo corpo caído no chão
Pela cantora que pela voz musical gritava
Sozinhas nos palcos da vida
Acabam passadas
Rejeições altas, descasos, indiferenças
Atordoadas na lama da contemporaneidade
E a sociedade alça
O mártir
O grande homem
Humano novamente ataca,
Chega-se ao poder
Deixa rastro de sangue
Preto, feminino, afeminado, obeso
Desnutrido, vermes
tudo quando é nota menor
E em suas covas seguem o peso
Morto
Vazio
Famigerado
Necessário?
*
Quimeras radiotivas
O que é a nossa luz colorida
Senão uma quimera?
Vida, larga
Entupida
O que é essa cor
Senão reflexões infinitas?
Vida, lago
Profundo
Eu que em éter
Me acertei
Em cheio resplandeci
Fecundado, embebido espírito respirado
Eu que entorpeci
O cheiro da minha terra aguada
Quando desci chuva naquele chão
Quando, agora, liquidez, desilusão explodida.