Quatro poemas de Tula Pilar
Tula Pilar fazia parte do Grupo Raizarte, um coletivo de música, dança e poesia atuante a partir de 2004 em Taboão da Serra e em muitos outros espaços culturais de São Paulo e inclusive outros estados. Atuava nele com os filhos Pedro Lucas e Dandara. Participava de saraus, mesas e debates com foco nas mulheres menos favorecidas socialmente, na mulher negra e nos artistas e escritores da periferia. Encenava a performance (monólogo) “Eu sou uma Carolina”, na qual fazia um paralelo entre sua própria história e a de Carolina Maria de Jesus. Poemas seus foram publicados em algumas antologias de coletivos de saraus da periferia de São Paulo e em alguns exemplares da Revista Ocas. Apresentava os poemas de sua autoria com performance de dança afro (dança negra) ou cantados em parcerias com alguns músicos convidados. Faleceu em 11 de abril de 2019, deixando seu legado de arte e resistência para todos.
Nota da editora: Meu primeiro contato com a poeta Tula Pilar ocorreu em 18 de março de 2019 por meio das mídias sociais. Muito amavelmente, aceitou o meu convite para realizar esta publicação. Depois de mais algumas trocas de mensagens, os poemas foram enviados por ela no dia 27 de março, e eu fiz o agendamento da postagem para a data de hoje. Há pouco mais de uma semana, fui surpreendida pela triste notícia de seu falecimento. Nesse breve contato que tive com ela através da internet, tive a impressão de se tratar de uma pessoa muito gentil e positiva. Uma personalidade solar. Agradeço a oportunidade de ter podido conhecê-la, ainda que virtualmente. Esta publicação é uma modesta homenagem da Ruído Manifesto a essa potente artista da palavra. Os poemas abaixo integram o seu livro Sensualidade de fino trato (Sarau do Binho, 2017) e estão plenos da vitalidade que ela emanava e que, segundo seus amigos mais próximos, também era uma de suas características mais marcantes.
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VESTIDO RODADO
Lá vem a negra de vestido rodado
Ai que delícia seu requebrado
Me deixou tonto desconcertado
De salto alto com um bom gingado
Cangote jeitoso, sorriso lustroso
Cintura marcada traseiro empinado
A negra me deixa excitado
Na roda de samba com um belo bailado
Me deixa todo desconcentrado
Ai! negra!
Olhar vivaz, mão na cintura no ritmo do samba
É uma delícia o seu requebrado!
No balançar do vestido rodado
Boca bonita, nariz achatado, linda!
Caso com ela para ser dominado…
Ah! Que bonito seu vestido rodado
Lindo recorte bem decotado
Tirou meu sono, faltei no trabalho
Para ver a negra do vestido rodado
Que na roda de samba me deixa encantado
Com o balançar do vestido rodado
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COMIDINHA GOSTOSA
Tocou no baile com meu violão
Usou até minhas notas musicais
Usou para me dar uma cantada
Leu meu nome nos jornais
Revirou a minha bolsa
Não pagou a conta
Me desprezou por cem Reais
Me apertou e me comeu, não doeu….
Me lambeu e me beijou, gostei….
Me expulsou às 5 e voltei às 10
Me amou mais uma vez, fingi que era meu freguês
Enchi seu copo de vinho! Mas, derramei só para pirraçar!
Pirraça de amor acaba na cama, eu sei….
Usei vestido sem calcinha, fiquei na beira do fogão
Usei cebola para temperar a relação
Vem comer do meu guisado! Cuscuz, arroz, feijão!
Coma tudo bem gostoso. Que até te faço um ovo frito meu bem!
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DELÍRIO
Delírio dos corpos que se movem na penumbra da noite
Peles que se roçam na escuridão
Silhuetas dançantes ao clarão do luar
Que invadem as frestas do canto reservado para o acontecer
Fumaças e cheiros…
Um liquido licoroso na taça, adoçará ainda mais o delírio que se pretende sentir entorpecendo a razão
Bíceps Troncudo circunda o pescoço um do outro
Protegem alternados movimentos frenéticos no chão de estampas
De ladrilhos recém cobertos por colcha de retalhos escrito palavras ousadas
Caçada incontida, sorriso para seduzir, prazer infinito…
A noite já se faz dia
Sentimentos romperam a aurora
Vidraças fechadas, sol querendo entrar
Figuras desnudas adormecidas
Sobre a colcha de retalhos escrito palavras ousadas
*
O AFRICANO 02
Tentou fugir da brasilidade de uma das mulheres negras com quem se envolveu
Uma moça de nádegas grandes, empinadas e firmes
O africano, sentiu o pênis subir dentro das calças, sem poder controlar.
Agarraram-se, tiraram toda a roupa mais uma vez
As horas passaram, o dia correu…
Precisavam ir para o trabalho mas, com vontades ensandecidas
Fizeram sexo no meio da sala
Bocas tumultuaram em momentos de êxtase, em lambidas safadas e incontidas ele diz o quão doce é a sua xota…
Vícios incontroláveis…
O africano de corpo forte, alto, naturalmente musculoso, Pênis monumental
A moça de medidas perfeitas, pele de ébano, o fez desesperar-se com seu divino requebrado. Mesmo quando vestida…
Nua o fez esquecer os compromissos, esquecer do tempo
Amaram-se. Também dançaram no ritmo frenético de um som africano
Vestidos, horas mais tarde, saem apressados para o trabalho, entraram no ônibus lotado rumo ao centro da cidade…