Quatro poemas de Victor Hugo Guesser Pinheiro
Victor Hugo Guesser Pinheiro nasceu em São José / SC em 1992, onde mora até hoje. Casado pai de dois filhos, trabalha na área da Educação física, sua primeira formação; está concluindo o curso de Letras. Em 2018 publicou sua primeira obra de poemas, E Sem Demora, aflorando ainda mais a necessidade da escrita. Seu segundo livro, BALADAS DESAFINDAS e outros concertos, está previsto para o segundo semestre de 2019. Site: www.victorhugopinheiro.com/ instagram: @poemais.victorhugo
Os poemas abaixo compõem o livro E Sem Demora.
***
SORVETE
Hei de sorver-te,
minha pequena namorada
mulher amante minha
minha grande amada,
hei de sorver-te
hoje e amanhã
durante a janta e no café da
manhã.
Hei de sorver-te
na correnteza dos dias e
por mais dez mil anos
sem e com perfume (mas de bem poucos
aprumes)
antes e após o banho.
Hei de sorver-te
na sala, sacada, cozinha e
na cama
soterrada de pétalas ou coberta
por lama,
hei de sorver-te
os centros e os cantos
de todo o corpo,
boceta e
boca
sensata
e louca
mergulhando-me em encantos.
Hei de sorver-te
com hálito de pimenta, poema ou
sorvete.
Hei de sorver-te
sem roupa ou de túnica
até te transar o meu
odor
sendo tu, a única,
dona
do meu eterno
amor.
*
NUANCES CLIMÁTICAS
Rasuro a distante paisagem com meu lápis
[ficcional.
À montanha, dormente, finjo ser passional
pois a desejo revelada, em nudez
doce e descarada, entregue de uma
só vez
ao dilúvio.
No eco de sua perpétua surdez
jazem os cânticos dos românticos iludidos
daqueles que acreditam que dor de amor
é pior
que dor de parto, aturdidos
pelo aperto do abraço de quem parte
para voltar só em outras chuvaradas.
O fogo nada mais consome
tampouco as chagas assustam,
e essa montanha, um dia, some
junto com essa paisagem que,
até lá,
receberá um outro nome.
*
POEMA COMO ARMA PARA ACABAR COM FASCISTAS
Em algum árido lugar na Somália
um homem negro; com impressões digitais gastas e
genoma único;
maxilares nus;
a carne fria em agonia;
a esperança perdida;
a família explodida
por uma bomba lançada de sabe-se lá onde
por causa de disputas por poder e ouro,
rasteja nas suas últimas e lentas horas
sem muita demora
sem esperar mais nada a não ser
que a morte, sem lhe cobrar encargos, o leve logo
deste mundo sem compaixão.
Enquanto nos Estados Unidos
o presidente, com seu bilionário corte de cabelo,
gaba-se de seus avanços nucleares
e barreiras territoriais
tendo tempo ainda para piadas banais
sobre os refugiados,
perante uma plateia que o aplaude e o ovaciona
cada um dali, também, com impressões digitais ímpares
e único genoma.
*
EM TI
Acordaste-me de um sonho abrupto
Tolo sonho de criança
Um sono quase que corrupto
De ausente esperança
Despertaste-me de uma cama vazia
Como um rio sem foz
Ou um tenor sem voz
Cuja coberta permanecia vã e fria
Apresentaste-me então outra realidade
onde pude conhecer
o acalanto de tuas mãos,
o gosto de um filho,
a eterna primavera nas tuas vértebras de felina,
a estranha e por vezes insustentável capacidade de
Amar e
sentir o amor
Trouxeste-me um calor
como se fosse a própria vida,
e na cama, que agora é mais comprida,
durmo profundamente
regozijado e agarrado
em ti
que mora agora ao meu lado.