Quatro poemas e quatro light paintings de Carolina Braga Ferreira da Costa
Carolina Braga Ferreira da Costa é fotógrafa, artista visual/digital e escritora negra.
Blog: confrontecompoesiahoje.com
E-mail: ferreiratcarolina@gmail.com
Instagram: @ferreiratcarolina
Portfólio: ferreiratcarolina.format.com
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sobre ouvir as vozes de nossas mulheres
mulheres negras não se suicidam, digo à minha prole
ainda que lavem o arroz aos prantos, não se suicidam
elas são mortas
antes que pensem no sono letífero, voluntário e induzido
pelas mãos de seus companheiros, violadas amorosamente
pelos pedestres másculos desconhecidos, expostas à estranheza
são mortas por quem ao lado delas dorme, ainda estando quentes do sono, do tecido de
cobrir corpo, do sexo animalesco e sem consenso, da cólica noturna decorrente do sangue
menstrual – aviso prévio, presságio
ou pelos trabalhadores evangélicos que acordam às seis da manhã e as fazem apertar os
passos na rua escura, a caminho de seus trabalhos
são arrancadas do sopro-vida sem que saibam, ou bem quando pressentem o homicídio
hediondo fadado
antes que pensem em suicídio, são dadas como mulas abatidas, enquanto lavam as batatas
para o almoço, nas casas de madames, e são apalpadas pelas mãos inimigas dos senhores de
mansão
à minha prole
explico que mamãe tem contato diretamente com Deus ou com o Diabo – um só não bastaria
na proteção
perpetuar o sangue resiliente de minhas mulheres, das filhas minhas que vieram de meu
útero
na última noite de verão
perpetuar o sangue resiliente de todas as mulheres negras
é viver
sem que ontem não se morra
sem que amanhã não se vá
viver com que se conta
hoje
à prole minha de mulheres futuras
– sobre o sangue melânico de mulheres passadas –
conto-lhe que toda história só é história porque houvera fatalidade seletiva.
*
metástase
depois de me ter visto mortal
mulher com todos os traços naturalísticos do tempo
enfartada pelas histórias que não pude contar
num papel sem linhas
folha lisa, você me dissera adeus — caligrafia trêmula
configurando covardia intimidação
não pôde me ver regressar na linha da vida, não pôde
ao contrário, avessa
com queda capilar difusa
na menopausa que me esperara desde
a menarca, aos dez anos de idade
e, ainda que narrasse todos os finais felizes
sempre soubera que cortar as horas na metade seria um eufemismo monomaníaco
cortá-las, como Messias
poderia dá-lo a ilusão de que o tempo nos seria amigo, menos dinâmico
que o nosso amor não padeceria, assim como há de padecer nosso cachorro e nossa casa
e nosso corpo um-só
nossa promessa de eternidade
me ver exposta no tempo
faz lembrá-lo de que a vida é uma fila
e de que poderá ser o
próximo, como numa morte de gêmeos xifópagos
mas não junto a mim
jamais
porque eu que me morra aqui
comigo
e você aí
consigo
—
à covardia particular de quem não suportaria ver o tempo morrendo em meu corpo plissado
negar o ciclo diante de seus olhos consumidos pela catarata e de seu corpo de pé, esfolado
em frente ao meu
moribundo, rústico
ainda trêmulo, no papel sem linhas, me nega no crepúsculo
sabendo que não haverá vida no próximo alvor
me nega regressa, assim
porque me aceitar fatal
de forma antecipada
também é morrer.
*
sobre engolir zoológicos
quando nasci
coberta do cerne-âmago
de minha mãe
limparam-me
e aí vociferei
como uma fera
em voz
e feri ouvidos
berrei por todo o silêncio
que teria
de aguentar
um dia
passando
por alguns outros
que tomam banho
e imundos são
– isso
toda santa vez
em que lhes lasco
as palavras
e elas não são suficientes
seus asnáticos
elas devem ser.
*
sobre desaguar no seco
Vejo-me-reflexo
nos olhos-espelhos-teus
estes que não choram
por mim
jamais
nem pelas dores
que tu me causas
::
e eu oceano
lágrimas e flores
enquanto
tu és a seca
cactos e rochas
em teu deserto
onde sustenta-se pouca vida.
*
*
*
*
Carol Calixto Becrra Velasquez
PARABENS ,SOU PRESIDENTE DA ACADEMIA DE LETRAS DE ITAPÓA .POETA CRUZ E SOUSA./ESTAMOS ESPERANDO .NOVOS CONTACTO .CACA VELASQUEZ (POETA COLO,MBIANO)