Seis poemas de Nalu Gonzaga
Nalu Gonzaga nasceu em terras mineiras, mais precisamente em Juiz de Fora. Descobriu-se poeta aos 14 anos, quando encarou o medo de expor seus sentimentos e escreveu, no bloco de notas do celular, poemas de amor. Mas foi aos 15, quando se descobriu bissexual, que ela colocou sua voz nas redes sociais, escrevendo. Hoje, ela tem 17 anos. E como uma típica canceriana, continua apaixonada por tudo que lhe proporciona encontros pessoais e coletivos.
***
A Cortina
Acaricio a cortina como quem coloca teus cabelos para trás de tua orelha
e chego-a delicadamente para o lado como quem te puxa para perto.
Observo a chuva como quem olha no fundo dos teus olhos
e noto as gotas na janela caindo precisas e sutis
como as minhas mãos tocando teu corpo.
Reparo os trovões aconchegantes
como teus abraços repentinos.
E solto imediatamente a cortina
como fazemos ao perceber a aproximação de estranhos.
Escondo parte do caderno enquanto escrevo
como uma adolescente tenta esconder seu segredo mais profundo:
Todas aquelas vezes que nos beijamos com medo
todas aquelas vezes em que nos encontramos escondidas
todas aquelas vezes em que nos recordamos do nosso amor
por garotas.
*
A bancada
Entre as dores que eu tenho que lidar
você não está.
Bagunço o cabelo tentando arrumar
a bagunça existente na cabeça
caminho pela casa
passo o café.
Entre as dores que eu tenho que lidar
você não está.
Apoio os braços na bancada
repouso minha testa
observo meus pés
inquietos.
Entre as dores que eu tenho que lidar
você não está.
Repito
mentindo
pra mim mesma
todas as manhãs
em que compenso o sono perdido
repousando na bancada da cozinha.
*
TINTIN!
Um brinde a todas as versões de mim, a mim, as versões que fui e sou, as coisas que senti e sinto. sinto muito, muito mesmo. um brinde a grandeza do ser sendo, do amar ao máximo, do agir crendo, sem culpa. porque… não tem porquê. se você não vem, eu me vou. porque… eu me venho, me tenho, me sou. se você não fica, eu vou ficar? eu sigo e sigo sorrindo, vivendo minhas ações e crenças. às minhas versões, peço bença. mas nunca, nunca, licença. que aqui a terra é segura, fértil, verde-esperança, madura. aqui, não cabe pressa e sobra espaço pra dança. aqui, as ondas carregam o fixo e a maré é mansa. no ar, o que está, voa. no fim, não ficar é a boa. um brinde: TINTIN! ao meu viver, que ecoa.
*
não critica não
nem me olha assim
com esse olhar de reprovação
deixa eu me movimentar
e assim
aliviar a tensão
deixa eu te chamar pra dançar
e aí sim
vai ver como é bom
quem canta seus males
espanta
quem dança seus males
abraça
e só quem se entrega ao ares
entende a graça
*
eu vasculhei as mídias. eu fiz um ritual onde todas as coisas vívidas se organizaram se apareceram se demonstraram. e assim pude escolher dentre as coisas vividas o que iria se manter se aparar reaprender se ser. eu fiz um ritual onde só o sentimental manifestou querer ficar ficando em si focando em si se sendo. eu fiz um ritual e descobri coisas que eu não posso deixar ir deixar de rir de sentir de viver de vir no agora no aqui. eu fiz um ritual no olho do furacão na ponta da onda na música da banda que a gente não gosta no dedilhado do violão na boca do vulcão em erupção na música que a gente gostava mas não no choque das placas tectônicas. eu fiz um ritual e descobri que é inevitável a mudança inefável o movimento incontrolável o sentimento nas crônicas. eu fiz o ritual e tudo mais o escambau deixei ir todo o mal que é pouco quase nada muito mesmo é o bem o bom o zen que fica mesmo que eu não queira… fica – espelhadas – desde aquele momento em que você foi embora e ficou por aqui em mim.
*
FIM
Sabe, eu demorei muito pra entender os sinais
todas aquelas vezes em que eu tive que segurar o choro
e coisa assim
não vai acontecer mais
lide com o tsunami
que os nossos choques provocaram
porque se você é terreno
e tentou ser vendaval
levantando ondas
contra mim
que sou aquática
azar o seu
eu não podia fazer nada
além de mergulhar
e atravessar.