Seis poemas de Olivia Haes
Olivia Haes nasceu em Brasília e cresceu em Niterói, que considera sua cidade natal. Economista, com mestrado e doutorado na área de economia de inovação, foi parar no Canadá por conta da carreira profissional. A distância das raízes trouxe à tona sua maior paixão: a arte da escrita. Não há palavra em seu papel que não seja memória ou esperança.
***
Quando surto é feito flor
Hoje eu senti
o vento da morte
sofrendo sem passaporte
pelos continentes
Senti
a luz do sol
atravessando a rua
em transeúnica
Como se na fala da gente
faltassem palavras
e o silêncio fizesse florescer
pessoas
*
ANDARILHA
Sou
uma multidão a bordo do meu corpo
as existências diluídas que me afagam
as resistências acariciadas que reverberam
Coleciono
os gritos derretidos na garganta
e os olhares espessos das almas
minhas e tantas
Sou
a andarilha que atravessa pátrias feito vento
o vento que sonha ser lírio feito tempo
o jardim da liberdade que cultivo a cada passo
*
A noite
cobre o corpo
com sua tecitura
de desejos desenhados
sobre uma manta prateada
A ponta do fio
preso no pensamento
é tempo desfiado
Seu tecido é
espesso, mas maleável
*
cada tanto tem seu tudo
cada passo que calço
cada abraço que lanço
cada choro que águo
cada plano que traço
cada estrela que sonho
cada sol que me esqueço
de cada tempo que passa
de cada nada que sinto
tanta calçada que passo
tanta lança que abraço
tanta água que choro
tanto traço que plano
tanta estrela que anoiteço
tanto de tudo que não me esqueço
de todo tempo que passa
de todo tanto que sinto
cada um tem o seu tanto
até que tudo
*
A condição humana é sentimental
Estirado sobre o pensamento estava meu corpo
como se fosse a vida feita de carne e osso
e o sentimento fosse inválido, obtuso.
Estou a um passo de mim,
mas o relógio segue à minha frente
como se fosse a vida feita de segundos e algemas.
Acho cansativa essa ideia fixa de felicidade,
como se fosse a vida apenas um instante.
Prefiro viver em paz.
*
a dança que me sobra
nas sobras
do horizonte
vejo
uma multidão
de dedos
desesperados
enquanto
o meu balança
no meio
sem tato