Seis poemas de Óscar Fanheiro
Óscar Fanheiro nasceu em Moçambique, na província de Maputo: capital do país, onde se encontra a viver até hoje. É estudante de Ciências da Comunicação e de Ciências Sociais e Filosóficas. Em 2016 foi finalista da primeira edição do Concurso Literário Fim do Caminho. Foi editado em antologias, com especial atenção a 1° Antologia de Contos Criminais Moçambicanos: O Hamburguer Que Matou Jorge. No momento encontra-se a trabalhar no seu mais novo projecto de poesia, onde se estreia na prosa poética.
***
[…]
Atiro grãos de saliva ao movimento das estátuas em surdina matutina; espelhos caçam infindáveis auguras no ressoar do progresso. Há quem fale da angústia; eu a sinto a derreter o gelo entre os dentes, ou ainda, a desabrochar o frungo das mágoas na língua. Arde a fome na palavra; mastigo o assobio da solidão, ergo novos galhos para amar o grito: o casulo. Entre as mãos a métrica anuncia a presença de um deus que acende o futuro no farol do silêncio. Manhãs saudosas há que florescem espinhos na lama
*
[…]
1.
Nódoa extensa
arde
——— nos soluços
do vácuo
a eletrecutar a noite
na geometria
——— de
um raio matinal
*
[…]
Estou deitado no deserto de fios de algodão, a olhar para a idade das memórias penduradas na flacidez do meu corpo: o tempo tem o sabor de abandono nos momentos de incerteza, ou mesmo de morte; sinto nas entranhas que o gozo expurga a dor e o cansaço da espera. Enquanto, o dorso de um sonho inaudito veleja na imensidão do verão a cortar nos poros dos dias uma enorme cicatriz de angústia sitiada na celeste cidade da solidão. Então, entre a língua e o silêncio um anzol aviva o soalho de um sorriso sem gramática inteligível às sombras. Um voo sem igual de paz interior.
*
Miradouro de Maputo
Aqui ardem arestas de ar; uma alsa salgada estende-se no beco do silêncio a tatuar pedras de diamante com suas silhuetas primaveris. A praia cresce nos ombros de uma acácia vermelha que ondula no peito do vento, a pescar caligrafias que dormem elétricas nas mãos; um rugido adormece o tédio antílope, reinventa a poesia, crepúscula a alegria e o tempo. Há um deus transpirando nos lábios dos dedos de um abraço vespertino nesta tarde desértica de calor.
*
A Estrada
Na cidade já se morre de penúrias,
cá,
no subúrbio: a estrada é um laço
entre a espada da morte
e um cenáculo de pernas
——— abertas
em pleno festival de abraços
—————– à luz onde se sangra:
a penúria, a mediocridade,
————- a porcariedade, a traição,
—————– a baixeza –
a morte que nós suburbanos
—respiramos todo
————————–maldito dia.
*
Baixa
O palácio da assembleia popular
É um tanto que lúgubre
——————————Ao por do sol:
Rostos empaledecidos,
——————–Troncos e pernas definhando de cansaço,
Vómitos, escarros, inveja,
—————-Pretos, brancos, africanos, americanos, asiáticos e por fim europeus;
Velhos, jovens, casados, solteiros, casados, contabilistas, deputados, músicos, poetas, crente, pagão, mendigo e ladrão, é tudo mesma merda;
————–Merda que nem o lixo de prédios dividindo a cidade
————————————-Em nova e velha,
E pelo clímax da pobreza
———————–Alguns gritam: baixa, compone, t3, Patrice, casa branca, 700
E não se ouve museu;
Mas a gritaria não se sepulta, ouve-se ainda:
Dez, dez maçã,
——————–Amabolaxa hi dez;
Moço não vai uma foda bem dada com broxe e tudo,
Pode ser sem camisinha,
—————————————E o cúmulo do orgamos termina quando
Se ejacula toda desumanidade
—————nos lábios de uma flor qualquer, numa dessas garagens imundas.
———————–E por fim, pendura-se num My-love
————-Qualquer.